Rio -  Olhando o espetáculo absolutamente musical que os ingleses fizeram, e me lembrando do número dos tambores chineses, imediatamente pensei que nossa abertura de Olimpíadas 2016 está no papo. Temos canções e ritmos de sobra e músicos de primeira.

E quanto aos cantores, bem, estes eu fiquei fazendo paralelo o tempo inteiro entre as estrelas inglesas e quem abaixo da linha do Equador faz frente à cena britânica. Annie Lennox, deslumbrante, adentrou o gramado num barco fantasma, de vestido vermelho do final do século XIX, com seres alados tipo fantasmagoria.

Temos Ney Matogrosso de cocar indígena na cena do Festival de Montreux, bunda de fora, 1983. Coloca ele cantando ‘Deus Salve a América do Sul’ seminu aos 71 anos, com franjas e penas e crinas de cavalo, taca um tronco do Kuarup que se abra em nave espacial e o leve. Tem que pegar pesado, e acabou. Não pode ser comportado, porque não é assim que nos vemos.

Somos um povo do balacobaco. Imagina se a fleugma britânica, fria e distante, virou aquilo, com a Rainha se jogando de para-quedas, só nos resta apelar para uma Carmen Miranda cibernética, que entre desmontada e se construa na frente da audiência, tipo Paulo Barros. Vai ser uma comoção. Quem são as nossas Spice Girls? Modernas, meio cafonas, mas adoradas pelo público e sobretudo por crianças? Deus, reúne Xuxa, Angélica, Eliana e Mara Maravilha, veste todas de Paquitas e reza!

Mas também pode ser um sósia do Chacrinha, com as Chacretes, sei lá. Gente, estou viajando porque tudo começa com coisas descabidas que vão tomando sentido no processo, com o decorrer do tempo. Chama-se ‘brain storm’, tempestade de pensamentos. Outra obrigatória é ‘Aquarela do Brasil’, que faz as vezes de ‘Because’. Quem são os nossos Beatles? O povo da bossa nova, né? Tom, Vinicius, Menescal, João Gilberto. O mundo adora e reconhece. Tem que ter. Para o lugar de ‘Imagine’, cantemos ‘Garota de Ipanema’.

No quesito construção, para Big Ben botemos um Cristo Redentor, e para os contos infantis, sai Mary Poppins e Harry Potter e entra Mazzaropi e seu Jeca Tatu e a Emília do ‘Sítio do Picapau Amarelo’. E, na boa, para peitar Mr. Bean, nossa atriz indicada ao Oscar, Montenegro, La Fernandona. No lugar de George Michael, temos Carlinhos Brown; para a London Eye, o M do Sambódromo e em vez da Orquestra Sinfônica, bateria de escola de samba neles.

Tudo isto reunido num estádio modernérrimo, que nem o deles. Ih, gente, aí o bicho pega: temos o conteúdo do show, mas o entorno disto tudo é que vai ser o lugar onde a porca torce o rabo.
(* Milton Cunha é colunista do jornal O Dia Online)