Por Eliane Cantanhêde - Estadão
Uma das cenas mais chocantes, e revoltantes, dos últimos tempos foi aquele assassino do Paraná espancando a própria mulher dentro do elevador do prédio onde moravam. Ele agredia a moça, uma advogada jovem e linda, sem ao menos franzir a testa. A expressão dele não era de ódio, era de poder. Como se esmurrasse uma coisa, um saco de batatas.
Trata-se de um casal de classe média alta, bonito, com curso superior, e o crime foi com requintes de crueldade, terminando com a queda da moça pela janela. Assim, a história ganhou enorme repercussão. Mas foi só mais uma, numa rotina de violência que atinge as mulheres de todas as classes sociais, em todas as regiões.
Segundo o anuário da violência, divulgado ontem, 2017 registrou um recorde de assassinatos no País, com impressionantes sete mortes de homens e mulheres por hora. Por hora! Mas os dados sobre as vítimas mulheres têm um lado particularmente assustador.
Foram 221 mil casos de violência doméstica no ano, 60 mil estupros e 4,5 mil assassinatos. O que que é isso, minha gente? Estão tratando as mulheres como coisa para usufruir e jogar fora a qualquer hora! E justamente quando a Lei Maria da Penha – um marco no combate à violência contra a mulher – completa 12 anos. Como “comemoração”, vimos, além do crime bárbaro e nojento do Paraná, uma onda de feminicídios e o cotidiano de mortandade de mulheres no Rio, nas demais capitais e no interior do País afora. Eles espancam, estupram, esfaqueiam e atiram em mulheres por serem mulheres. Em Brasília, um policial matou a mulher com um tiro na cara na casa da mãe dela, deixando órfãs duas filhas, de 11 e 8 anos. Outro assassino atirou a companheira pela janela. É como se esses homens se sentissem no direito de decidir sobre a vida e a morte da “sua” mulher. Logo, é uma doença não de um indivíduo, mas de uma sociedade inteira, com o Estado impassível – ou simplesmente impotente. Não se sabe o que é pior.
Mas, duro mesmo, é a complacência da própria sociedade. Não sai da minha cabeça como nenhum vizinho, vizinha, porteiro, ninguém ouviu os gritos de desespero da Tatiane Spitzner? Ela apanhou no carro, entrando no prédio, dentro do elevador, tentou escapar num andar, foi empurrada no seu próprio andar. E ninguém percebeu ou ouviu em nenhum minuto?
Há poucos anos, eu estava no salão quando a cabeleireira chamou a secretária: “Olha! Ele está dando nela de novo!”. A sequência de sopapos e chutes, num quarto do outro lado da rua, era acompanhada com uma espécie de torcida: “Ih! Agora foi na cara”, “Caiu, ela caiu!”. Ficaram as duas se distraindo com a cena, enquanto as clientes olhavam placidamente, lavavam as mãos.
Diante da minha perplexidade, reagiram com duas máximas que rondam a sociedade: 1) “Eu não vou me meter em briga da marido e mulher”; 2) “Se ela vive apanhando e continua com ele é porque gosta”.
E o Disque Mulher do DF e nacional? Não serviram para nada. Um simplesmente não atendeu, apesar de mais de uma hora de tentativas. No outro, a atendente queria saber o nome do agressor, o nome da vítima... que ninguém tinha. A má vontade era evidente, gritante.
Lá pelas tantas, apareceram dois policiais com ar de enfado, como se aquilo não fosse nada demais. Subiram, ninguém atendeu e eles foram embora. Simples assim. No dia seguinte, o casal sumiu. E aquela moça certamente vai engrossar as estatísticas de assassinatos. Se é que já não engrossa, como indigente.
Bem, em época de eleições, é urgente discutir economia, governabilidade, princípios. Mas não discutir a guerra urbana, a violência, a saúde, a educação e a mortandade das mulheres é jogar fora uma grande oportunidade. E manter tudo como está.
Uma das cenas mais chocantes, e revoltantes, dos últimos tempos foi aquele assassino do Paraná espancando a própria mulher dentro do elevador do prédio onde moravam. Ele agredia a moça, uma advogada jovem e linda, sem ao menos franzir a testa. A expressão dele não era de ódio, era de poder. Como se esmurrasse uma coisa, um saco de batatas.
Trata-se de um casal de classe média alta, bonito, com curso superior, e o crime foi com requintes de crueldade, terminando com a queda da moça pela janela. Assim, a história ganhou enorme repercussão. Mas foi só mais uma, numa rotina de violência que atinge as mulheres de todas as classes sociais, em todas as regiões.
Segundo o anuário da violência, divulgado ontem, 2017 registrou um recorde de assassinatos no País, com impressionantes sete mortes de homens e mulheres por hora. Por hora! Mas os dados sobre as vítimas mulheres têm um lado particularmente assustador.
Foram 221 mil casos de violência doméstica no ano, 60 mil estupros e 4,5 mil assassinatos. O que que é isso, minha gente? Estão tratando as mulheres como coisa para usufruir e jogar fora a qualquer hora! E justamente quando a Lei Maria da Penha – um marco no combate à violência contra a mulher – completa 12 anos. Como “comemoração”, vimos, além do crime bárbaro e nojento do Paraná, uma onda de feminicídios e o cotidiano de mortandade de mulheres no Rio, nas demais capitais e no interior do País afora. Eles espancam, estupram, esfaqueiam e atiram em mulheres por serem mulheres. Em Brasília, um policial matou a mulher com um tiro na cara na casa da mãe dela, deixando órfãs duas filhas, de 11 e 8 anos. Outro assassino atirou a companheira pela janela. É como se esses homens se sentissem no direito de decidir sobre a vida e a morte da “sua” mulher. Logo, é uma doença não de um indivíduo, mas de uma sociedade inteira, com o Estado impassível – ou simplesmente impotente. Não se sabe o que é pior.
Mas, duro mesmo, é a complacência da própria sociedade. Não sai da minha cabeça como nenhum vizinho, vizinha, porteiro, ninguém ouviu os gritos de desespero da Tatiane Spitzner? Ela apanhou no carro, entrando no prédio, dentro do elevador, tentou escapar num andar, foi empurrada no seu próprio andar. E ninguém percebeu ou ouviu em nenhum minuto?
Há poucos anos, eu estava no salão quando a cabeleireira chamou a secretária: “Olha! Ele está dando nela de novo!”. A sequência de sopapos e chutes, num quarto do outro lado da rua, era acompanhada com uma espécie de torcida: “Ih! Agora foi na cara”, “Caiu, ela caiu!”. Ficaram as duas se distraindo com a cena, enquanto as clientes olhavam placidamente, lavavam as mãos.
Diante da minha perplexidade, reagiram com duas máximas que rondam a sociedade: 1) “Eu não vou me meter em briga da marido e mulher”; 2) “Se ela vive apanhando e continua com ele é porque gosta”.
E o Disque Mulher do DF e nacional? Não serviram para nada. Um simplesmente não atendeu, apesar de mais de uma hora de tentativas. No outro, a atendente queria saber o nome do agressor, o nome da vítima... que ninguém tinha. A má vontade era evidente, gritante.
Lá pelas tantas, apareceram dois policiais com ar de enfado, como se aquilo não fosse nada demais. Subiram, ninguém atendeu e eles foram embora. Simples assim. No dia seguinte, o casal sumiu. E aquela moça certamente vai engrossar as estatísticas de assassinatos. Se é que já não engrossa, como indigente.
Bem, em época de eleições, é urgente discutir economia, governabilidade, princípios. Mas não discutir a guerra urbana, a violência, a saúde, a educação e a mortandade das mulheres é jogar fora uma grande oportunidade. E manter tudo como está.
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