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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

O SOLDADO 123 (crônica de José Wilson Malheiros)

Estamos chegando na época de Finados. Hora propícia para falar sobre um fato que até hoje guardo na alma e que, com certeza, marcou profundamente aquele grupo de jovens que, como eu, prestaram o serviço militar no inesquecível TG-190, aquela escola de civismo, cidadania e de honradez que existia em Santarém, nos tempos que antecederam a chegada do 8º. BEC.

O atirador cento e vinte e três era um jovem magrinho, moreno e tímido, que morava no bairro da Prainha.

De certa maneira, como sabem, os exercícios físicos e a maneabilidade eram pesados, exigindo de nós, os recrutas, boa saúde.


Certo dia, na hora da chamada, ele não respondeu. Mais tarde a mãe veio avisar que ele fora acometido de uma crise de apendicite aguda e já estava sendo operado no hospital do SESP.

Pediu e recebeu licença de trinta dias para se recuperar da cirurgia. Como a cicatrização estava demorando, nova dispensa foi concedida.


Quase três meses depois, ele apareceu e pediu para ser incorporado à tropa, novamente. Falou que era patriota e que já estava ávido para continuar servindo a pátria.

Mas, a cansativa rotina de atividades foi demais para ele. A cicatriz abriu-se, inflamou e ele acabou falecendo. Foi um constrangimento geral. A nossa juventude ficou mais triste, nossos sonhos lacrimejaram. Era a primeira vez que a maioria de nós via a morte assim tão de perto. Ficou decidido que ele seria enterrado com todas as honras e estilo militares.

A tarde do funeral estava nublada e nos oprimia a todos. Quando o cortejo fúnebre chegou ao cemitério, os soldados já se postavam em alas simples (fileiras) desde a porta de entrada e acompanharam ladeando o esquife, a passos lentos, até o local onde estava a cova que ia receber os restos mortais do nosso irmão de farda.

Antes do caixão descer ao túmulo, cantamos o Hino Nacional, foi retirada a bandeira nacional que cobria o caixão, dobrada e entregue à família.A seguir, doze atiradores fardados executaram uma salva de vinte um tiros de fuzil, com intervalos de aproximadamente trinta segundos entre cada rajada.

Arranjaram para mim um tamborete. Sebastião Ferreira segurava a partitura musical.

No momento em que o corpo do soldado descia à sepultura comecei a executar, no trompete, o toque lúgubre e saudoso de silêncio, simbolizando a nossa tristeza, espalhando pelo entardecer um sentimento de meditação, de saudade e de dor. Era a hora da saída das mocinhas do Colégio Santa Clara e o acontecimento as trouxe todas para o cemitério, entre espantadas e curiosas.

Quase todo mundo chorava. Eu quase nem consegui chegar ao fim do solo da melancólica melodia. Um nó na garganta, as lágrimas que desciam pelo meu rosto, tremor nas mãos, emoção sem fim, que até hoje dorme em meu peito, quando recordo daquele entardecer santareno.

Soldado 123! Sei que teu Anjo da Guarda te guiou e te conduziu para uma das moradas do Pai Eterno, no infinito!

12 comentários:

  1. Acabo de ler esta belíssima peça que me emocionou muito. É um típico retrato da vida.

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  2. Que comentário mais infantil. Em vez que ficar pensando na morte não será melhor fazer o bem durante a vida? É muita fantasia desnecesária.

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  3. Também tive felcidade de servir no Tiro de Guerra 190 - uma escola de formação de cidadãos dignos. Tenente Assis, Sargentos Damasceno e Amazonas, figuras inesquecíveis! É salutar relembrar essas coisas.

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  4. Narativa emocionante. Demonstração de amor e respeito pelo próximo. Gostei da crônica.

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  5. Ilustre santareno. doutor José Wilson:
    Prossiga relembrando fatos tristes ou alegres da nossa Santarém. O TG 190, integrado por jovens de todas as classes sociais - brancos, pretos, ricos e pobres, faz falta para formar cidadãos honrados. Com certeza diminuiria o grande número, existente hoje em nossa terra, de marginais, de gangues, de malfeitores. Abraços do Carlos Augusto Almeida, bairro Jurunas - Belém.

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  6. Episódio lindo e comovente. Só mesmo muita sensibilidade e talento para nos contar uma estória dessas. Parabéns ao cronista.

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  7. "Muito lindo!
    Miguel Augusto Fonseca de Campos, Brasília DF".

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  8. Simples e objetivo, o estilo do cronista Malheiros é motivo para lermos os seus textos com muito prazer, muito agrado. O blog do Ercio é, realmente, um instrumento valioso pois procura, sempre, colocar em evidência os valores da maravilhosa Santarém, cidade onde vivi por cerca de 7 anos, dias felizes. Com carinho, um abraço ao cronista JWM, ao Ercio e seus leitores. Cândida Moreira - Natal/RN

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  9. Olha o ´Pimpão` aí, geeeeente! É coisa nossa! É gente boa! Sou fã de sua pessoa e de suas crônicas.

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  10. Ercio, um dos apelidos mais carinhosos esse Pimpão.
    Quem me chama assim é porque gosta de mim.
    Um abraço ao leitor aí das sete e cinco.
    zé wilson, Pimpão.

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  11. José Wilosn,
    Gosto muito de ler no blog do Ercio,as suas crônicas. Estou rezando, pedindo a Deus que recupere a saúde do Tio Dó,meu mestre no Santa Clara. Um abraço da Selma Cruz - Ananindeua

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  12. Que bela homenagem feita ao seu amigo, Dr. Wilson. Me emocionei! Parabéns.
    Sérgia Cal

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