O sr. Hamad, esposo da minha querida professora Hermínia, estava em São Paulo. Pegou um taxi e pediu que o levasse ao aeroporto. No caminho, o motorista pergunta:
- Desculpe, mas para onde o senhor vai viajar?
Hamad responde: Vou para Santarém, no Pará!
E o motorista: Santarém? Então dá um abraço no Dororó!
O passageiro ficou espantado. Em uma das maiores cidades do mundo, encontrara exatamente um taxista que conhecia seu compadre santareno. Era o mesmo que encontrar, como se diz, uma agulha no palheiro.
O homem do taxi era o Rui, genro de Dona Quinha Papaléo, uma amiga da família que residia na paulicéia. Vejam só a coincidência.
Na década de sessenta, não havia Banco do Brasil em Monte Alegre. A instituição era representada por membros da família do senador Cattete Pinheiro.
Tio Dó ia fazer uma inspeção no escritório da localidade e eu fui com ele.
Viajamos de barco-motor. O trecho da viagem conhecido como Cataú, no rio Amazonas, é até hoje conhecido pela violência de suas famosas tempestades de vento, chuva, ondas enormes e naufrágios.
Conosco não foi diferente. Mais ou menos pelas três da tarde um temporal jogava nossa embarcação como se fosse uma folha seca ao léu. A bordo, rezas, pavores e perigo.
E Tio dó prosseguia impávido, corajoso, tranquilo e confiante, ao lado do piloto. Parecia que estávamos trafegando com céu aberto e brisa refrescante. Ao olhar aquela calma, meu medo foi embora.
Tio dó era extremamente franzino de corpo mas tinha um espírito forte, sereno, invulgar, bem evoluído e gigantesco, do tamanho da Amazônia.
Essa grandeza de alma foi forjada no lar humilde do alfaiate José Agostinho, meu avô, onde muitas vezes, por falta de dinheiro, comiam arroz, caldo e farinha... e achavam gostoso!
Eu tive estreito relacionamento com ele. Aprendi a admirá-lo desde cedo.
Quando trabalhei no Banco do Brasil ele foi meu chefe imediato. Lider severo, exigente, mas bondoso.
Possuia uma grandesa ímpar, repito. Jamais teve ciúmes do irmão Isoca, pois sabia, no íntimo, que há lugar para todos e que seu talento musical também era enorme. Nunca vi nele qualquer gesto ou conduta que pudesse denotar mediocridade.
Mais tarde, quando fui regente do Coral do Tribunal Regional do Trabalho, em Belém, ele era minha inspiração.
Cantei sob a regência do meu tio, no Coro da Catedral de Santarém, quando as missas eram ainda em Latim.
As missas solenes das oito nos domingos até hoje são inesquecíveis e me marcaram muito o espírito. Meu pai no órgão, Tio Dó na regência do coro e Frei Prudêncio no altar.
Tio Dó nos ensaiava e nos ensinava com uma paciência e dedicação de paizão.
Eu estudava a língua latina no Dom Amando, mas os outros componentes do Coral não liam partituras, nada sabiam da língua oficial da igreja. Então tinha que começar pela pronuncia, pelo significado das palavras etc.
Dava um trabalho danado, mas era gratificante para ele, que sorria satisfeito quando tudo era concluído e o coral estava pronto para cantar J.S. Bach, Palestrina, Wilson Fonseca, Pe. José Maurício, Canto Gregoriano, Tomas Samaí, Frei Pedro Szing, Haendel, Beethoven e outros luminares da música sacra.
Tio Dó também mostrou sua competência quando comandava as Bandas de Música santarenas. Também toquei sob sua batuta em momentos inesquecíveis, nos coretos, nas procissões, nas data cívicas...
Escritor, historiador, professor, instrumentista, excelente chefe de família, cidadão exemplar, músico, compositor, que mais se pode dizer do nosso querido Tio Dó?
Santarém tem a obrigação de fazer com que este grande homem não seja esquecido.
Fica em paz, tio Dó e não esquece da gente aí no lugar feliz onde vais ficar na mansão celeste.
- Desculpe, mas para onde o senhor vai viajar?
Hamad responde: Vou para Santarém, no Pará!
E o motorista: Santarém? Então dá um abraço no Dororó!
O passageiro ficou espantado. Em uma das maiores cidades do mundo, encontrara exatamente um taxista que conhecia seu compadre santareno. Era o mesmo que encontrar, como se diz, uma agulha no palheiro.
O homem do taxi era o Rui, genro de Dona Quinha Papaléo, uma amiga da família que residia na paulicéia. Vejam só a coincidência.
Na década de sessenta, não havia Banco do Brasil em Monte Alegre. A instituição era representada por membros da família do senador Cattete Pinheiro.
Tio Dó ia fazer uma inspeção no escritório da localidade e eu fui com ele.
Viajamos de barco-motor. O trecho da viagem conhecido como Cataú, no rio Amazonas, é até hoje conhecido pela violência de suas famosas tempestades de vento, chuva, ondas enormes e naufrágios.
Conosco não foi diferente. Mais ou menos pelas três da tarde um temporal jogava nossa embarcação como se fosse uma folha seca ao léu. A bordo, rezas, pavores e perigo.
E Tio dó prosseguia impávido, corajoso, tranquilo e confiante, ao lado do piloto. Parecia que estávamos trafegando com céu aberto e brisa refrescante. Ao olhar aquela calma, meu medo foi embora.
Tio dó era extremamente franzino de corpo mas tinha um espírito forte, sereno, invulgar, bem evoluído e gigantesco, do tamanho da Amazônia.
Essa grandeza de alma foi forjada no lar humilde do alfaiate José Agostinho, meu avô, onde muitas vezes, por falta de dinheiro, comiam arroz, caldo e farinha... e achavam gostoso!
Eu tive estreito relacionamento com ele. Aprendi a admirá-lo desde cedo.
Quando trabalhei no Banco do Brasil ele foi meu chefe imediato. Lider severo, exigente, mas bondoso.
Possuia uma grandesa ímpar, repito. Jamais teve ciúmes do irmão Isoca, pois sabia, no íntimo, que há lugar para todos e que seu talento musical também era enorme. Nunca vi nele qualquer gesto ou conduta que pudesse denotar mediocridade.
Mais tarde, quando fui regente do Coral do Tribunal Regional do Trabalho, em Belém, ele era minha inspiração.
Cantei sob a regência do meu tio, no Coro da Catedral de Santarém, quando as missas eram ainda em Latim.
As missas solenes das oito nos domingos até hoje são inesquecíveis e me marcaram muito o espírito. Meu pai no órgão, Tio Dó na regência do coro e Frei Prudêncio no altar.
Tio Dó nos ensaiava e nos ensinava com uma paciência e dedicação de paizão.
Eu estudava a língua latina no Dom Amando, mas os outros componentes do Coral não liam partituras, nada sabiam da língua oficial da igreja. Então tinha que começar pela pronuncia, pelo significado das palavras etc.
Dava um trabalho danado, mas era gratificante para ele, que sorria satisfeito quando tudo era concluído e o coral estava pronto para cantar J.S. Bach, Palestrina, Wilson Fonseca, Pe. José Maurício, Canto Gregoriano, Tomas Samaí, Frei Pedro Szing, Haendel, Beethoven e outros luminares da música sacra.
Tio Dó também mostrou sua competência quando comandava as Bandas de Música santarenas. Também toquei sob sua batuta em momentos inesquecíveis, nos coretos, nas procissões, nas data cívicas...
Escritor, historiador, professor, instrumentista, excelente chefe de família, cidadão exemplar, músico, compositor, que mais se pode dizer do nosso querido Tio Dó?
Santarém tem a obrigação de fazer com que este grande homem não seja esquecido.
Fica em paz, tio Dó e não esquece da gente aí no lugar feliz onde vais ficar na mansão celeste.
O cronista soube registrar, com felicidade, a personalidade do Tio Dó. Nem mais, nem menos. Exato. Gostei.
ResponderExcluirLinda a crônica, tio Zé Wilson! Agora o "tio Dó" está ao lado do "vô Isoca" ensaiando muitos coros celestes! :)
ResponderExcluirDororó e Isoca - ícones da cultura musical de Santarém. Foram o Pelé e o Garrincha da música.
ResponderExcluirQuisera eu saber expressar sentimentos de alegria ou de tristeza com tanta sensibilidade como o faz o doutor José Wilson Malheiros. Não conheci o seu tio Dororó, porém, as referências sobre ele são as mais significativas em termos de cidadão probo e profissional de muito valor no magistério e na música, principalmente. Excelente crônica!
ResponderExcluirWilde era torcedor do São Francisco, daí a tristeza no meio da galera do Leão santareno. Na música, Dororó so fazia gol de placa. Que Deus o guarde em seu reino.
ResponderExcluirAmigo leitor das 19:36, o Tio Dó era torcedor ardoroso do SÃO RAIMUNDO, o Pantera... eheheheh!
ResponderExcluirjosé wilson malheiros
Muito lindo!!!!!!
ResponderExcluirSonia Leite, Florianópolis.
No sepultamento do mestre Dororó compareceram a sua esposa, os filhos e dois sobrinhos, o Tinho que mora aqui em Santarém e o Doutor Vicente que veio de Belém e fez um pronunciamento muito bonito depois da missa na Igreja do Santíssimo Sacramento. O Tinho também brilhou na condução da orquestra jovem. Sentimos a falta do Doutor José Wilson que soubemos que infelizmente anda muito afastado da família. O artigo mais parece um arrependimento. Viva o mestre Dororó!
ResponderExcluirJose Wilson, quantas lembranças boas, quantas saudades senti ao ler a sua crônica. O conhecimento que você tem, sobre essa inesquecível e saudosa pessoa que carinhosamente chamávamos de Dororó, e que tive o privilégio de conhecer, me transportou realmente de volta a nossa querida cidade e para minha mocidade, me fez relembrar dos momentos felizes que vivemos. Da missa das oito, com o fabuloso Coral sobre a regência de Dororó e também, do seu querido Pai Isoca tocando o órgão, uma das musicas cantada nesse Coral que mais me marcou foi a “Aleluia” de George Frederic Handel. Lembranças também do latim que aprendi com o professor Irmão Francisco no Colégio do Dom Amando.
ResponderExcluirNa missa de minha formatura como advogado, solicitei e fui atendido que, a última musica a ser tocada pelo Coral Baccarelli no encerramento da missa, fosse “Aleluia” de Handel, naquele momento fique alegre pela minha formatura, mas bastante emocionado, pois vieram na memória todas as pessoas do Coral e, em especial, a regência magnífica do grande e saudoso Dororó, essa lembrança para mim é inesquecível.
Você foi muito feliz em escrever essa crônica, porque me transportou para o lugar onde nasci e cresci ao lado de pessoas dignas entre elas o saudoso Dororó.
Muito interessante e incrível essa história do motorista de taxi aqui de São Paulo no encontro com o esposo de sua professora Hermínia, é como falas uma cidade tão grande e um encontro desses acontece.
Emerildo Bentes Pereira
Belíssima homenagem ao seu tio, Sr. Wilde/Dó. Só quem viveu - e como viveu - ao lado de uma criatura dessas, que eu não conheci mas agora admiro, pode escrever com tanta generosidade e arte.
ResponderExcluirQuando eu morrer quero ter a sorte de ter um sobrinho que me faça uma homenagem dessas.
Wankes Chaves, Belém Pará
Caro JWM,
ResponderExcluirQuem me induziu ao erro foi o meu irmão que é franciscano apaixonado. Então, ao invés de leão, leia-se pantera. Mas o gol de placa não muda, é a realidade.
Uma sugestão à prefeita Maria do Carmo: nomine Wilde Fonseca o Parque da Vera Paz que está sendo construido e certamente ficará belíssimo. Ou, então, uma praça, uma rua, uma escola...
ResponderExcluirNão concordo com o anônimo das 23:17, porque em momentos de dor não é correto fomentar discordias, notadamente de âmbito familiar. Com certeza todos os parentes do maestro Dororó sentiam por ele, além de grande amizade, admiração sem tamanho. Parentes, amigos, fãs, mesmo ausentes do sepultamento, o sofrimento da perda desse ente tão querido não foi pequeno.
ResponderExcluirQuero agradecer a todos os comentários à minha crônica.
ResponderExcluirSei que todos os elogios são devidos à personalidade e ao ser humano que meu tio foi e continua sendo no mundo espiritual.
Quanto às discórdias, meu irmão das 12:38, mencionadas por você, a gente vai tirando de letra.Nem leve a sério. Exercitemos o perdão.
Aprendi que minha consciência é meu juiz e não tenho mais idade para picuinhas.
Agradeço, também, mais uma vez, à generosidade do amigo Ercio, que me convidou para escrever neste Blog cheio de merecido sucesso e isso não é surpresa para quem o conhece.
josé wilson malheiros
Lamento pelo falecimento do Maestro e Colega aposentado do Banco do Brasil Dororó, que muito contribuiu para a cultura Santarenae para empresa onde trabalhou a vida toda.
ResponderExcluirLembro, como se fosse hoje, do Dororó pois, em 1971, eu assumi na Ag. do Banco do Brasil em Santarem, era na Lameira Bittencourt, entre as ruas 15 de agosto e 15 de novembro, aliás eu fui a 1a. funcionária de Santarem, pois so haviam homens na agencia e as outras 2 colegas que foram nomeadas junto comigo pra Santarem, Graça Reale e Joaquina Rebelo, eram casadas e estavam grávidas, então so assumiram apos cessar o periodo de licença maternidade a que tinham direito. Resumindo, tive o prazer de trabalhar junto ao Chefe Izoca e Chefe Dororó, que me ensinaram muito do muito que sabiam do Banco do Brasil.
Que esteja em ótimo lugar, junto aos seus que ja se foram. Que familia maravilhosa!
Saudades. Um abraço aos que ainda aqui se encontram. Regina Silva, de Floripa mas orgulhosamente Mocoronga.
Meu caro José Wilson,
ResponderExcluirSolidarizo-me contigo e os parentes relacionados com o Mestre Dororó. Sinto no teu escrever, o carinho, a admiração e o respeito pelo marcante cidadão que ele foi.
Divago supondo o encontro do Dororó com Izoca, em outra dimensão e os ouço trocando ideias sábias e apaixonadas pela terra e coisas santarenas. e pelos entes queridos que ficaram, mas que fazem juz a ascendência que escreveu história.
Sinta meu abraço caloro, amigo e irmão. Fernando Sousa.
Doutor José Wilson Malheiros:
ResponderExcluirSeu tio Wilde sempre demonstrou ao longo de toda a sua vida possuir personalidade marcante e uma dignidade acima de qualquer suspeita. Daí, merece a sua homenagem através desta bela crônica.
José Wilson,
ResponderExcluirDo Coro da Catedral na missa das 8 eu sempre lembro com saudade e fico triste quando ouço atualmente nas missas ´modernas`, músicas de péssima qualidade. Lembro que o Expedito Toscano e sua irmã Nélia faziam parte do coral, estou certa? Você poderia citar outros nomes? Um abraço. Conceição Vasconcelos, de Manaus.
Estamos muito tristes, com a perda do nosso querido Dororó. Ele vai sempre morar nos nossos corações e será imortal.
ResponderExcluirTive o privilégio de estudar com Dororó, e jamais vou esquecer a famosa história do "guaraná". O curso era letras, e era ministrado no Colégio Alvaro Adolfo. Dororó todas as manhãs nos encontrava para dizer que quem tomasse o guaraná em pó ficava em ponto de bala, e, verdade ou não, os homens da turma começaram a tomar o guaraná, e todas as manhãs, eram muitas risadas. Também cantávamos, era uma diversão, Dororó comandava as brincadeiras. Sempre tratava todo mundo igual e abraçava a todos. Nunca mudou seu jeito simples de ser, e quando nos encontrava por aí, era sempre um abraço, sempre lembrando dos velhos tempos. O céu ficou mais alegre, e a orquestra maravilhosa, imagine a orquestra no céu com Izoca e Dororó!
Cordialmente,
Maria Suely Viana lima