O plenário do Supremo Tribunal Federal se reúne nesta quarta-feira (23/3) para decidir o destino da Lei Complementar 135/10, a chamada Lei da Ficha Limpa. Os ministros decidirão se as novas regras de inelegibilidades criadas com a nova lei poderiam ter sido aplicadas já nas eleições de 2010, como decidiu o Tribunal Superior Eleitoral.
A expectativa e as especulações sobre o voto do ministro Luiz Fux, que definirá a questão e tirará o STF do impasse a que chegou nos dois julgamentos anteriores sobre o tema, são grandes. O ministro já declarou em entrevistas que a lei “conspira em favor da moralidade pública”.
O elogio à norma não significa qualquer indicação de seu voto. Mesmo os cinco ministros que votarão pela aplicação da lei só em 2012 declararam publicamente que a consideram salutar em muitos aspectos, mas que ela depende de ajustes para não contrariar a Constituição Federal. A definição sobre a aplicação imediata da lei pode alterar significativamente o quadro de deputados e senadores que tomaram posse neste ano.
O caso em julgamento é o do candidato Leonídio Bouças (PMDB), que, no ano passado, disputou uma vaga de deputado estadual para a Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O relator do recurso é o ministro Gilmar Mendes.
O candidato foi barrado por ter sido condenado por improbidade administrativa, sob acusação de usar a máquina pública em favor de sua candidatura ao Legislativo mineiro nas eleições de 2002, quando era secretário municipal de Uberlândia. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais suspendeu seus direitos políticos por seis anos e oito meses.
O ponto nevrálgico da discussão é o impasse sobre se a lei se submete ou não ao chamado princípio da anterioridade previsto no artigo 16 da Constituição Federal. O artigo 16 diz o seguinte: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.
O racha entre os ministros se deu exatamente pelas diferenças entre o conceito do que é processo eleitoral. A Lei da Ficha Limpa foi publicada em 7 de junho de 2010. Assim, só poderia valer de fato a partir de 7 de junho de 2011. Na prática, só se aplicaria aos candidatos a partir das eleições municipais de 2012. Esse é o entendimento dos ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso.
Os outros cinco ministros — Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Ayres Britto e Ellen Gracie — entendem que sua aplicação é imediata porque novas hipóteses de inelegibilidade não alteram o processo eleitoral. Logo, não teriam de cumprir o prazo de carência de um ano previsto na Constituição Federal.
Para os ministros que defendem a aplicação imediata da lei, só tem poder de interferir no processo eleitoral uma regra que desequilibra ou deforma a disputa. Como a Lei da Ficha Limpa é linear, ou seja, se aplica para todos indistintamente, não se pode afirmar que ela interfere no processo eleitoral. Logo, sua aplicação é imediata.
No caso de Bouças, que será julgado hoje, também será discutida a tese da retroatividade da lei em casos de condenação, que não foi debatida pelo Supremo até agora. Os dois casos já julgados pelo tribunal — do candidato ao Senado Jader Barbalho (PMDB-PA) e do candidato ao governo do Distrito Federal Joaquim Roriz (PSC) — versavam sobre a renúncia como forma de escapar de processo de cassação.
Decisão provisória
Em 27 de outubro do ano passado, o STF decidiu que a Lei da Ficha Limpa tem aplicação imediata e gera efeitos sobre os pedidos de registro de candidaturas de políticos que renunciaram ao mandato para escapar da cassação, mesmo antes de as novas regras de inelegibilidade entrarem em vigor.
Os ministros julgavam recurso de Jader Barbalho (PMDB-PA), que disputou uma vaga no Senado pelo Pará, contra decisão do Tribunal Superior Eleitoral que rejeitou o registro de sua candidatura. Barbalho foi barrado por ter renunciado ao mandato de deputado, em 2001, para escapar da cassação por acusação de improbidade.
Para chegar à decisão, contudo, foi usado um critério de desempate incomum em favor da aplicação da lei porque o tribunal precisava dar uma resposta à situação de indefinição às vésperas das eleições. Um mês antes, ao julgar recurso do ex-candidato ao governo do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PSC), o empate em cinco votos a favor da aplicação imediata da lei e cinco contra deixou a questão aberta, depois de 11 horas de discussões.
A decisão de Fux pode mudar o quadro caso o novo integrante da corte vote contra a aplicação imediata da Lei Complementar 135/2010, que estabeleceu novas regras de inelegibilidade. Por conta desse fator, advogados afirmaram que a decisão do Supremo era, de qualquer forma, provisória. A questão será, agora, definida.
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