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segunda-feira, 5 de março de 2012

Eliana Calmon não age como exige seu cargo

Por Eduardo Mahon, advogado em Mato Grosso e Brasília, doutorando em Direito Penal e membro da Academia Mato-Grossense de Letras.

Nenhum cargo público tem o condão de alterar a personalidade do ocupante, mas é pitoresco como alguns servidores públicos pretendem mudar a natureza de suas funções graças às suas personalidades ou, quando não, comprometer a imagem institucional da posição que ocupam diante de um capricho, de um tom particular, de uma nota pessoal.

É o caso da Corregedoria Nacional de Justiça, que deveria ser um posto de alta credibilidade compatível com uma figura sóbria, discreta, conservadora do sigilo e da elegância. Evidentemente, não seria a Corregedoria Nacional capaz de fazer uma correção ortopédica na pitoresca personalidade da ministra Eliana Calmon. Declarações de rompante com forte opinião pessoal têm marcado a triste intersecção entre o que o cargo demanda e o que a ocupante não pôde dar: sobriedade.

Os termos “vagabundo” e “criminoso”, imputados indiscriminadamente a magistrados brasileiros, são de uma infelicidade institucional para a Corregedoria Nacional e para o Conselho Nacional de Justiça, angariando antipatia generalizada de quem deveria aplaudir — o juiz. Estocadas beligerantes sem apontar nomes (aí sim, veríamos coragem verdadeira), afirmando haver togas criminosas e vagabundas no cargo da magistratura, fazem com que haja uma exposição não do criminoso e do vagabundo, mas do restante dos julgadores brasileiros, descredenciando-os junto à sociedade civil. Nada poderia ser pior.

Uma personalidade assim não pode ser punida por aquilo que é. Ninguém deverá ser apenado por seus pensamentos e opiniões, desde que não agridam qualquer cidadão. Nenhum histrionismo será punido. No entanto, lamentavelmente, opinião pessoal expressada de forma tão vulgar não só reflete o nível de educação, elegância e fineza do interlocutor, como rebaixa o próprio cargo. Porque de qualquer corregedor espera-se a máxima discrição, equilíbrio, declarações pensadas e bem arrematadas, porque importam enorme repercussão social e impacto particular no universo jurídico. No gládio entre o que o cargo exige e o que a pessoa tem para dar, não é raro sacrificar a venerabilidade do cargo, já que dificilmente alguém muda seus trejeitos, defeitos e idiossincrasias, sobretudo quando são as falhas pessoais saborosas excentricidades aplaudidas pela plateia.

Com a formação de brigadas de mocinhos contra bandidos, forma-se um clima de segregação interna no Judiciário, marcando quem é bandido e quem é mocinho, refletindo na mesma distinção da sociedade, que reclama honestidade do Poder Judiciário para o qual se socorre. Daí que o cidadão deverá consultar um oráculo, puro e perfeito, para saber se será julgado por um vilão ou um herói. E quem seria a pitonisa? Esse clima de caça às bruxas, depreciação da imagem judiciária e beligerância civil é o que há de pior numa democracia republicana que deveria ser regida pelo controle institucional, equilibrado e impessoal.

Eliana Calmon passará, mas a Corregedoria Nacional de Justiça não. Ficará, no entanto, uma sensação de faxina ética, limpezas típicas de totalitarismos ou, na melhor das hipóteses, uma frustração generalizada por não haver cadeia para supostos marginais não nominados. Além da desconfiança, esse covarde sentimento que espreita a imaginação humana. A Corregedoria Nacional deve ter desgastado emocionalmente Eliana Calmon, que talvez tenha ficado maior e mais popular, mas Eliana Calmon desgastou muito mais a Corregedoria Nacional de Justiça, que, certamente, ficou menor e mais popularesca. Desse conturbado conúbio de personalidade e cargos público, muitos filhos ficaram órfãos, entre os quais estão as irmãs isenção, discrição e serenidade, tão caras ao Judiciário. (No Conjur)

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