Por Reinaldo Azevedo:
Olhem aqui:
todos têm direito a um advogado. É fundamento do estado de direito.
Ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo ou a se
autoincriminar. É outro fundamento do estado de direito. Advogados
criminalistas não devem atender apenas freirinhas do convento das
carmelitas descalças e probos professores de educação moral e civismo.
Muito provavelmente eles não precisem de… advogados criminalistas. Isso
também é um apanágio do estado de direito.
Márcio
Thomaz Bastos (foto) é, sem dúvida, um dos maiores criminalistas do país. Fez
fama e grande fortuna nesse ramo. Que o advogado provavelmente mais rico
do país atue justamente na área criminal, eis um emblema da vida
pública brasileira, não é? Ao mesmo tempo, Bastos sabe cuidar de sua
reputação politicamente correta. O militante lulo-petista falou, por
exemplo, como “amicus curiae” no STF em defesa das cotas raciais.
Curiosamente, pronunciava-se em nome da Associação dos Advogados
Afrodescendentes. Adiante.
Não! Não
serei eu aqui a julgar doutor Márcio em razão da qualidade de seus
clientes. Isso não faz sentido. Seria o mesmo que dizer que o estado se
torna copartícipe de crime quando nomeia, por força de lei, um defensor
para o pior dos homicidas. O ponto definitivamente não é esse.
O problema
de Márcio Thomaz Bastos não é sua expertise de criminalista, mas a sua
inserção na vida política. Eu duvido que exista em qualquer outra
democracia do mundo alguém como ele. É militante partidário; é um dos
principais conselheiros e interlocutores de Lula (dentro e fora do poder
formal) — o mesmo Lula que tenta, a todo custo, manipular a CPI; foi
ministro da Justiça; guarda os arcanos da República e do PT…
Essa
condição lhe rendeu ontem (22), durante a CPI do Cachoeira, muitos elogios,
salamaleques e rapapés. Ora, foi durante a sua gestão no Ministério da
Justiça, com a Polícia Federal sob o seu comando, que se estabeleceu no
país a República do Grampo. Foi sob o seu comando que setores da PF
decidiram brincar de luta de classes, com algumas operações
espetaculosas para demonstrar que “os ricos também choram”. Sob os seus
auspícios, prisões, digamos, midiáticas ganharam o noticiário. O preso
poderia até ser solto logo depois, mas a notícia já estava garantida. E
se criou então um mito: acabou a impunidade, acabou a festa!
Acabou? Como
criminalista no Ministério da Justiça, foi dele a tese de que mensalão
era mero caixa dois de campanha. O esquema Delta, diga-se, tem tudo para
ser um mensalão de dimensões pantagruélicas. Não venham me dizer que
devemos encarar como coisa corriqueira o fato de Dr. Márcio ora estar de
um lado do balcão, tentando coibir o crime, ora estar do outro,
oferecendo seus préstimos profissionais a criminosos. Não há nada de
errado numa coisa. Não há nada de errado na outra. Uma e outra são parte
do jogo democrático. Quando as duas condições, no entanto, se juntam
num homem só, há algo de errado é na República.
Consta que a
defesa de Cachoeira custará R$ 15 milhões ao contraventor. 99,9% dos
criminalistas brasileiros — na verdade, dos advogados — não ambicionam
receber isso ao longo de, sei lá, 10 ou 15 anos; uma vida, quem sabe?
Por isso, claro!, parabéns ao doutor Márcio. Mas não o parabenizo,
não!, por ser, a um só tempo, um homem que domina segredos de estado e
do principal partido do poder e também o advogado de um criminoso que
tem relações íntimas com essas duas instâncias.
Se os
parlamentares quiserem elogiar o criminalista, fiquem à vontade. Se
quiserem elogiar o ex-ministro da Justiça, vá lá. As duas coisas no
mesmo discurso? Aí não! Isso é mais sintoma de um problema do que motivo
para regozijo. De resto, dado o perfil, não será doutor Bastos a
estimular Cachoeira a dizer tudo o que sabe justamente contra o grupo de
poder e a corrente ideológica que fazem do advogado a mais fina flor do
pensamento dito ”progressista e de esquerda” do Brasil.
Vejam que
coisa: Márcio Thomaz Bastos detém hoje segredos de estado (foi ministro
de uma das pastas mais importantes), segredo do PT e segredos do
Cachoeira. Tudo isso e, consta, mais R$ 15 milhões só nessa causa. O
Brasil que ele sempre disse que queria mudar tem sido muito generoso com
ele.
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