A decisão da Câmara de aprovar um projeto que acaba com a exigência
da aprovação das contas de campanhas eleitorais e reabilita os chamados
“contas-sujas” provocou reações negativas no Judiciário e nos movimentos
da sociedade que lutam contra a corrupção na política. Políticos e
especialistas eleitorais, no entanto, defendem a medida. Um dos que
votaram no Tribunal Superior Eleitoral, em março, pela necessidade de
aprovação das contas eleitorais para que o político possa se candidatar,
o ministro Marco Aurélio Mello alfineta os parlamentares e diz que não
foi a primeira vez que o Congresso Nacional reagiu a uma decisão de
tribunais superiores, aprovando leis em causa própria. Para o ministro, a
proposta acaba, na prática, com a prestação de contas, pois não haverá
consequência para as desaprovadas.
— É o faz de conta. A
Constituição Federal tem o princípio da razoabilidade. Será que é
razoável dar a quitação eleitoral mesmo diante da rejeição das contas?
Não se avança culturalmente cassando uma decisão de um tribunal superior
mediante lei, principalmente quando se decide em causa própria. Essa
aprovação não deixa bem na fotografia os congressistas — afirmou Marco
Aurélio.
Em nota, o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) repudiou a aprovação de afogadilho,
sem qualquer debate popular, de uma mudança na lei eleitoral. O
movimento espera que o Senado rejeite o projeto e conclamou a sociedade a
se manifestar contra o ato. “Sem qualquer debate popular (a Câmara)
aprovou lei que anistia os políticos que fraudaram suas prestações de
contas de campanha”, diz um trecho da nota. “O Projeto de Lei nº
3839/2012 atenta contra tudo o que deseja a sociedade brasileira, que se
encontra mobilizada em favor dos valores da ética e da moral, que devem
presidir as declarações do Parlamento.”
Políticos e especialistas
eleitorais argumentam que nem sempre a rejeição de contas eleitorais é
sinal de contas-sujas. Segundo eles, na maioria das vezes são problemas
contábeis, erros formais, provocados pela burocracia para prestar a
informação à Justiça eleitoral. Quando há uma irregularidade grave na
campanha, os adversários ou mesmo o Ministério Público podem tentar
cassar o registro e o mandato do candidato, com base em outro artigo da
lei.
— Nem sempre a rejeição da conta é sinal da chamada
contas-sujas. A prestação é mais do ponto de vista contábil e as
exigências são, de tal forma, intricadas, que o candidato quase que
precisa parar a campanha para prestar as contas de forma adequada —
afirmou o advogado eleitoral e ex-ministro do TSE, José Eduardo Alckmin.
No
Congresso, o líder do PSD na Câmara, Guilherme Campos, justifica que a
votação ocorreu porque o TSE estava demorando a definir algo que afeta a
vida de todos os partidos:
— O TSE alterou a regra com o jogo jogado. O que fizemos foi manter o mesmo critério.
Debate agora será no Senado
Líder do PSOL — único partido que encaminhou voto contra a aprovação do projeto na noite de terça-feira
—, o deputado Chico Alencar (RJ) diz que, a pretexto de defender quem
teve contas rejeitadas por pequenos erros contábeis, se manteve um
absurdo maior: uma lei na qual não há qualquer sentido em prestar contas
eleitorais, já que a rejeição não traz ônus.
— Essa lei acaba com
o instituto da prestação de contas. Prestar contas por que motivo, se
não é preciso aprová-las para ter a quitação eleitoral? A lei é um
facilitário para toda e qualquer candidatura, de bagrinhos a tubarões,
ninguém precisará se preocupar em prestar contas corretamente — disse
Chico Alencar.
Há dois meses, logo após a resolução do TSE de não conceder registro eleitoral para os políticos que tiveram contas eleitorais rejeitadas,
parlamentares da oposição e governistas se uniram para pedir que o
tribunal revogasse a decisão. Da reunião participaram dirigentes e
representantes de 18 legendas. (O Globo)
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