A imprensa faz publicidade opressiva em casos de grande repercussão. A
afirmação foi feita pelo advogado criminalista, Márcio Thomaz Bastos,
ao ser questionado pela jornalista Mônica Bergamo, em entrevista ao programa Ponto a Ponto, da emissora de TV por assinatura BandNews,
sobre o fato de defender políticos acusados de corrupção, sobretudo no
processo do mensalão. Ele é advogado de José Roberto Salgado, ex-vice
presidente do Banco Rural, no processo do mensalão, e defende também
Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. O programa foi
transmitido na noite sábado (9/6) e tem reprise às 20h30 deste domingo
(10/6).
“A grande imprensa tomou partido, elevou tudo a um ponto
simbólico muito forte”, disse ele se referindo ao caso do mensalão.
"Mesmo integrando um valor constitucional da mais alta nobreza, a
imprensa não está livre de sofrer críticas”, ressaltou. O ministro
lembrou de casos paradigmáticos onde a opinião pública atropelou o
devido processo penal, como no caso Suzane Richthofen, quando a
estudante acusada de matar os próprios pais foi julgada em meio ao
clamor público.
Lembrando Nelson Hungria, o entrevistado
classificou como “publicidade opressiva”, o papel da mídia em casos
como o de Richthofen, do casal Nardoni e mesmo o do assassinato da
atriz Daniela Perez. “ A vigilância da imprensa é fundamental, mas às
vezes ela erra”, disse. “É uma máquina que empurra a todos, como uma
tragédia grega, em que tudo já aconteceu, cabendo assim a encenação,
quando chancela o veredito definido lá atrás”, declarou.
Para o
ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, quando o assunto é aperfeiçoamento da
democracia e consolidação de valores civilizatórios, não há atalho nem
saltos evolutivos. Trata-se de um processo longo e gradual que depende
mais do fortalecimento de valores sociais e amadurecimento das
instituições do que de virtudes individuais. “É um processo, as coisas
não dão saltos. Concordo com a ideia de Montesquieu que postula que a
sociedade não se constrói sobre a virtude dos homens, mas sobre a força
de suas intituições”, disse Márcio Thomaz Bastos, citando o filósofo
francês.
Ele também falou sobre sua experiência na advocacia. “Já
estive de ambos os lados. Já defendi causas que em tive a opinião
pública — e publicada — a meu favor. É uma delícia. Mas já enfrentei a
maré, estando absolutamente na minoria, o único a segurar a mão do réu
no fim da escada, crucificado e contra o vento”, contou.
Na entrevista, Thomaz Bastos disse que é
necessário termos consciência que é imprescindível dispormos de uma
Polícia que investigue, um Ministério Público que acuse, um Judiciário
que julgue e um sistema penitenciário que, pelo menos “ não alimente a
reinscidência”. Mas que não se pode pensar que atropelar esse processo
irá nos conduzir a um maior rigor na correção de maus hábitos e no
aperfeiçoamento da democracia e da Justiça, segundo ele.
Depois de
assistir a uma reportagem, veiculada no programa, que informou que 7
em cada 10 brasileiros são interessados em política, ao contrário da
alienação endêmica apregoada pelo senso comum, Thomaz Bastos observou
que há uma distorção provocada pelo fato de, no Brasil, a corrupção
estar mais exposta e ser combatida do que jamais foi.
“Vamos
chegar a um ponto em que a democracia, por sua própria prática, vai
resolver isso”, disse. “Lembremos que, no início do século passado, na
Câmara dos Comuns, no Reino Unido, havia um guichê onde os
parlamentares recebiam o dinheiro, uma espécie de mensalão da época. [A
depuração gradual de costumes] não impediu que a Inglaterra se
tornasse um país altamente democratizado. Isso dá a esperança de que,
pela reiteração dos usos, possamos encontrar isso, um outro patamar de
regime democrático”, avaliou.
Sobre o aperfeiçoamento das práticas
investigativas em contraponto às operações pirotécnicas promovidas por
autoridades policiais, o advogado lembrou que o processo de
aprimoramento não está livre de “imaturidades”. “A Polícia
Federal precisa de tempo. Essas instituições, quando sobem de nível,
passam a um novo paradigma. Precisam passar pela infância e
adolescência. Muitas vezes, são acometidas por doenças — “doença
infantil, como uma ‘cachumba’. [Isso] é expresso na vontade de vazar
documentos, por exemplo”, disse o ex-ministro. “Mas existem mecanismos
para coibir isso. Essas coisas vão desaparecer pois terão de ser
trabalhadas em um nível de civilização, numa perspectiva de
amadurecimento”.
Márcio Thomaz Bastos observou, contudo, que a
Polícia Federal vive um período de sofisticação e refinamento de suas
práticas em um intenso processo de amadurecimento e transição.
Provocado pelo sociólogo Antonio Lavareda, que disse que o sistema
político brasileiro compreende quatro vícios graves (o sistema
proporcional de lista aberta, coligações nas eleições proporcionais,
ligações ad hoc e a falta da cláusula de barreira), o
ex-ministro da Justiça ponderou que a reforma política, embora seja
importante, na sua visão, não é imprescindível. “A reforma política não
é tão fundamental. Tenho muitas dúvidas sobre voto distrital e lista
fechada. No mundo inteiro existe essa discussão. Não há um modelo
claro”, disse.
O entrevistado ainda ponderou que o aprimoramento
das instituições e a correção de maus hábitos é fruto dos tempos e que
os valores seguem uma lógica histórica. “Quando comecei a advogar, o
imposto de renda era facultativo, pois não havia sanção, não havia
repressão. Depois, a Receita criou todo um programa, inclusive de jogar
símbolos sobre o cidadão, como o ‘leão’, e todos se viram na obrigação
de pagar”, disse. “Os hábitos se refinam. Molhar a mão do corretor,
por fora, na compra de um imóvel era muito comum até há pouco tempo.
Hoje é cada vez menos frequente.”
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