Por Manoel Alberto Rebêlo dos Santos e Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho
A sociedade brasileira não será mais a mesma após o julgamento do mensalão. Satisfeita ou não, ela responderá à pulsão anímica resultante de fatores que movem o imaginário popular. O Judiciário e a percepção pelo povo de sua atuação também mudarão.
O primeiro impacto é a inédita presença de cabeças coroadas entre os réus da ação penal. Na triste tradição brasileira, o processo criminal só funciona para punir aqueles que, mesmo em liberdade, já formavam o gigantesco exército da exclusão.
Independentemente dos resultados, tais poderosos aparecem como acusados, aqui de crimes tão ultrajantes que a presunção de inocência, secular garantia constitucional, já não parece socorrê-los, como demonstra o andar da carruagem pelos votos até agora colhidos no julgamento.
Todos se recordam de que o ex-presidente Lula se disse traído pelos mentores do mensalão, de cuja própria existência, em manobra camaleônica, viria depois a duvidar. Ora, ninguém é traído em sua boa-fé por uma miragem.
A sabedoria popular não absorve o ilusionismo, mesmo que o povo, pela manipulação dos governantes, ainda não tenha chegado a degraus elevados de educação política.
Percebe-se a ligação entre aquela traição e o episódio vivido pelo ex-deputado Roberto Jefferson, ao bradar na CPI seus temores em relação ao chefe da Casa Civil da Presidência da República, José Dirceu, na ocasião notório aspirante à sucessão presidencial: “Sai daí, Zé, sai daí para não prejudicar o presidente da República, que está inocente (...) tenho medo de vossa excelência, porque desperta em mim os instintos mais primitivos.”
Nesse quadro, já referido como de tenebrosas transações, o país poderá ter vivido uma quadra recente com o Legislativo parcialmente reduzido a um balcão de negócios, movimentado por vivandeiras do meio político, banqueiros, empresários e publicitários, além dos necessários coadjuvantes.
O importante é que as instituições vêm cumprindo seu papel, provavelmente um processo dessa natureza não poderia ser imaginado em alguns países vizinhos. Aqui o quadro é diverso, pois o STF decidirá com independência, em veredicto preponderantemente jurídico, embora não se possa desconhecer algum componente político próprio do julgamento em cortes constitucionais.
Os resultados serão apontados com toda a liberdade à nação, que tem recebido da imprensa admirável atuação.
Sem dúvida, ganharão a democracia e a República que, rompendo o dique das tenebrosas transações, vão respirar tuaçãofortalecidas, pois essa página infeliz da nossa história não deverá tornar-se passagem desbotada na memória das novas gerações (em recriação livre), o estandarte do sanatório geral vai passar, a democracia brasileira já amadureceu para tanto.
O espírito dos versos de Chico Buarque e Francis Hime pode ficar tranquilo.
Manoel Alberto Rebêlo dos Santos é presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho é presidente da Comissão Mista de Comunicação Institucional do tribunal
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