No debate sobre biografias travado entre, de um lado, escritores e editores, e, de outro, celebridades, não faltaram judiciosos argumentos contrapondo a liberdade de expressão ao direito de privacidade.
Mas e a respeito do digníssimo leitor, o destinatário da obra?
Biografia não é ficção. A escritora tcheca Janet Malcolm traça uma didática distinção entre um ficcionista e um biógrafo: o primeiro é “dono de sua própria casa e pode fazer nela o que quiser; pode até derrubá-la, se tiver inclinação para tanto”, ao passo que o biógrafo “é apenas um inquilino, que se deve ater às cláusulas do contrato, que estipula que ele deve deixar a casa (conhecida pelo nome de Realidade) nas mesmas condições que a encontrou”.
Ao comprarmos um romance, esperamos “consumir” personagens, situações e locais fictícios, excitando nossa imaginação com suas inverossimilhanças e suas fantasias.
Não nos é dado o direito de reclamar da desarrumação premeditada, da ousadia do dono da casa que eventualmente a bote abaixo conosco dentro, pois ao sermos convidados a entrar nesse espaço já devíamos contar com isso. Se gostamos ou não do que lemos, é outra história.
A mesma condescendência não merece o escritor de não ficção. A casa que habita não é dele; é a realidade. Desarrumando-a, nos oferece um produto defeituoso. Derrubando-a, nos vende escombros, puro entulho literário.
Com cada grupo puxando brasa para sua sardinha em discursos nos quais ética e liberdade não raramente servem para ocultar o fundo pecuniário que os motiva, editores e biografados passaram a advogar complexas teses jurídicas submetidas aos tribunais — o que lhes é de direito, mesmo atuando dissimuladamente em causa própria.
Por parte de nós, apreciadores do gênero, convém apenas advertir que, por mais convincentes as entrevistas com seus protagonistas, por mais fidedignas suas fontes e por mais exaustivas as investigações empreendidas pelo escritor, nada nos livrará do risco de levar para a mesa de cabeceira uma mercadoria estragada, sem nenhuma garantia de qualidade, sem direito a troca, nem a devolução. E isso vale para biografias autorizadas ou não.
Mas e a respeito do digníssimo leitor, o destinatário da obra?
Biografia não é ficção. A escritora tcheca Janet Malcolm traça uma didática distinção entre um ficcionista e um biógrafo: o primeiro é “dono de sua própria casa e pode fazer nela o que quiser; pode até derrubá-la, se tiver inclinação para tanto”, ao passo que o biógrafo “é apenas um inquilino, que se deve ater às cláusulas do contrato, que estipula que ele deve deixar a casa (conhecida pelo nome de Realidade) nas mesmas condições que a encontrou”.
Ao comprarmos um romance, esperamos “consumir” personagens, situações e locais fictícios, excitando nossa imaginação com suas inverossimilhanças e suas fantasias.
Não nos é dado o direito de reclamar da desarrumação premeditada, da ousadia do dono da casa que eventualmente a bote abaixo conosco dentro, pois ao sermos convidados a entrar nesse espaço já devíamos contar com isso. Se gostamos ou não do que lemos, é outra história.
A mesma condescendência não merece o escritor de não ficção. A casa que habita não é dele; é a realidade. Desarrumando-a, nos oferece um produto defeituoso. Derrubando-a, nos vende escombros, puro entulho literário.
Com cada grupo puxando brasa para sua sardinha em discursos nos quais ética e liberdade não raramente servem para ocultar o fundo pecuniário que os motiva, editores e biografados passaram a advogar complexas teses jurídicas submetidas aos tribunais — o que lhes é de direito, mesmo atuando dissimuladamente em causa própria.
Por parte de nós, apreciadores do gênero, convém apenas advertir que, por mais convincentes as entrevistas com seus protagonistas, por mais fidedignas suas fontes e por mais exaustivas as investigações empreendidas pelo escritor, nada nos livrará do risco de levar para a mesa de cabeceira uma mercadoria estragada, sem nenhuma garantia de qualidade, sem direito a troca, nem a devolução. E isso vale para biografias autorizadas ou não.
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