A estratégia também faz parte de um esforço para amenizar a crise no governo, depois que Lula responsabilizou a presidente Dilma Rousseff pela ação de busca e apreensão da Polícia Federal na empresa de seu filho caçula, Luís Claudio, na última segunda-feira, em São Paulo.
Oito horas após abrir a reunião do PT, Lula jantou com Dilma e com os ministros Jaques Wagner (Casa Civil), Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo), além do presidente do partido, Rui Falcão, no Palácio da Alvorada. Contou a ela que havia feito um discurso "para cima", na abertura do encontro, e pedido apoio para as medidas de ajuste fiscal.
"Vamos tocar em frente. As coisas estão difíceis, mas vão melhorar", disse ele, de acordo com relato de um dos participantes do encontro. Há dez dias, em conversas reservadas com Dilma e também com deputados do PT, Lula afirmou que Levy tinha "prazo de validade" e defendeu a sua substituição. A retórica de ontem, no entanto, foi bem diferente.
Diante da plateia petista, o ex-presidente admitiu que Dilma venceu a disputa do ano passado contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG) com um discurso contrário ao ajuste fiscal, mas, depois, foi obrigada a rever tudo o que havia prometido.
"Nós tivemos um grande problema político, sobretudo na nossa base, quando tomamos a atitude de fazer o ajuste que era necessário fazer", reconheceu o ex-presidente. "Ganhamos as eleições com um discurso e, depois, tivemos que mudar o discurso e fazer o que dizíamos que não íamos fazer."
Para Lula, a sociedade quer que Dilma dê um sinal de que está governando o País porque "ninguém aguenta" passar mais seis meses discutindo ajuste fiscal. "Vocês agora falam 'Fora Levy' como já falaram 'Fora Palocci'", lembrou o ex-presidente, numa referência a Antônio Palocci, que foi ministro da Fazenda entre 2003 e 2006. "Mas ninguém quer arrumar a economia mais rápido do que a Dilma. A única condição de a gente voltar a ter o prestígio que o PT já teve é recuperando a economia."
Com todos esses recados, a resolução aprovada pelo Diretório do PT desbastou ainda mais as críticas à política econômica feitas no 5.º Congresso do partido, em junho. Na ocasião, o coro "fora Levy" também havia sido abafado, por ordem do Palácio do Planalto, mas o PT conseguiu expressar na Carta de Salvador suas principais divergências em relação às medidas propostas pelo ministro.
Governabilidade - O documento que passou ontem pelo crivo dos petistas, porém, diz apenas que o movimento para recuperar as condições de governabilidade tem mais chances de êxito "se acompanhado por mudanças na política econômica que o PT vem sugerindo desde a realização do 5.º Congresso, em Salvador".
Em outras seis linhas, o partido também condenou os cortes nos gastos sociais, nos investimentos públicos e considerou "extremamente positiva" a proposta de recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Os petistas pediram, ainda, medidas que aumentem a tributação sobre a renda e a propriedade dos mais ricos, "ao mesmo tempo em que o governo reduz seus gastos financeiros, através do rebaixamento paulatino da taxa de juros".
Na última hora, a direção do PT retirou da resolução final um parágrafo dizendo que o ajuste fiscal e a reforma ministerial com maior peso conferido aos partidos de centro provocavam "tensões e divisões". Embora não citasse o PMDB, o texto não deixava dúvidas sobre a quem os petistas se referiam.
Questionado por que motivo o parágrafo foi retirado da resolução, Falcão afirmou que o partido achou melhor evitar mais ruídos. "A gente não quer que isso seja mal interpretado", argumentou Falcão. O presidente do PT, que já chegou a pedir a saída do ministro da Fazenda, disse ontem que nunca pregou o "Fora Levy". "Eu não 'fulanizo' esse debate", comentou.
Seis correntes do PT, mais à esquerda, apresentaram uma proposta de resolução cobrando mudanças radicais nos rumos da economia, "para gerar empregos e recompor salários", mas foram derrotadas.
Abaixo, a Resolução na íntegra:
O país permanece, um ano após a reeleição da presidenta Dilma Rousseff, sob intensa ofensiva conservadora. As forças mais reacionárias, dentro e fora das instituições, ainda que sem coesão ou alternativa que as unifique, se empenham para sabotar e tentar derrotar o governo, se possível levando à sua derrubada através de expedientes golpistas.
Este contra-ataque do conservadorismo, embora esteja enraizado nas condições internas da disputa entre classes e projetos, espelha também a mudança de cenário na América Latina. As correntes progressistas, que desde a virada do século acumularam importantes vitórias eleitorais nos principais países do continente, encontram-se atualmente sob fogo cerrado das elites locais e sua tradicional aliança com os centros imperialistas.
O pano de fundo do aprofundamento dos conflitos políticos e sociais está no prolongamento da crise mundial do capitalismo. As distintas burguesias locais buscam, por todas as formas, reduzir custos de produção, manter e/ou aumentar suas margens de lucro. Trata-se, nesta lógica, de impor salários menores aos trabalhadores, cortar gastos sociais dos Estados, aliviar cargas tributárias das corporações e acionistas, ampliar espaços do capital através de novas privatizações, eliminar ou mitigar direitos públicos, disputar mercados, entre outras medidas.
Esta mesma dinâmica leva ao recrudescimento da pressão das grandes potências sobre países que se deslocam de sua órbita hegemônica ou transitam por experiências que constituam obstáculos às políticas de recuperação capitalista marcadas tanto pelo aumento da exploração direta e indireta do trabalho quanto pela limitação da soberania nacional.
Mesmo sem que os governos dirigidos pelo PT tenham reunido condições para reformas de caráter estrutural, que alterassem o sistema de produção e apropriação da riqueza, numerosas frações das classes dominantes brasileiras se deslocaram para uma empreitada que busca recuperar o controle do Poder Executivo para as mãos de seus principais agentes políticos, liderados pelo PSDB e os monopólios da mídia.
A escalada da direita representa o desejo de retomar as rédeas do Estado para implementar, sem mediação ou concessão, um programa que realinhe o país aos fundamentos neoliberais, anulando conquistas sociais que marcaram o processo brasileiro desde 2003. O governo liderado pela companheira Dilma é o anteparo que precisa ser removido para a consumação da política sustentada pelos setores mais retrógrados.
Para além de impor seus interesses programáticos, as forças conservadoras desejam destruir a esquerda e os movimentos sociais, interditando o campo popular como alternativa de poder. Não é à toa que sua ofensiva incorpora manobras de criminalização, operando setores do aparato policial e judiciário com o objetivo de desestabilizar o governo, deslegitimar o PT e desgastar lideranças históricas como o ex-presidente Lula.
Denunciamos a campanha de perseguição política contra a esquerda, o PT e lideranças populares. Essa campanha visa eliminar da cena política brasileira e latino americana as vozes que defendem a igualdade, a liberdade e a superação do neoliberalismo. É por isso que agora Lula é vítima de perseguição da direita.
A legítima mas apertada vitória progressista nas eleições presidenciais de 2014, associada à ampliação da influência dos partidos de centro e direita no parlamento, animou o conservadorismo a confiar que poderia apostar suas fichas em uma rota de sabotagem e golpismo.
A queda de popularidade do governo acabou por dificultar a manutenção da base parlamentar depois da posse, criando clima mais favorável para a atração de segmentos centristas pela oposição de direita.
A situação congressual agravou-se também pela preponderância, dentro da bancada do PMDB na Câmara dos Deputados, de sua ala mais reacionária, capitaneada pelo deputado Eduardo Cunha. Depois de conquistada a presidência da casa, o parlamentar rapidamente pactuou com o bloco PSDB-DEM-PPS e assumiu a liderança de uma agenda para contrarreformas, além de flertar com o impeachment presidencial.
O Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, nestas circunstâncias, considera que o principal objetivo tático é derrotar a escalada golpista, isolar a oposição de direita e recuperar as condições plenas de governabilidade. Este movimento tem mais chances de êxito se acompanhado por mudanças na política econômica que o PT vem sugerindo desde a realização do 5o.Congresso, em Salvador. Tais mudanças podem reagrupar as forças populares e democráticas ao redor de um programa de desenvolvimento sustentado pela expansão do mercado interno, pela ampliação dos investimentos estatais, pela defesa do emprego e a majoração contínua da renda dos trabalhadores.
A recuperação fiscal do Estado deve ser encaminhada, como tem reafirmado o PT, com medidas que aumentem a tributação sobre a renda, a riqueza e a propriedade dos extratos mais abastados, ao mesmo tempo em que o governo reduza seus gastos financeiros, através do rebaixamento paulatino da taxa de juros.
Cortes nos gastos sociais ou nos investimentos públicos, posição defendida pelos porta-vozes do capital financeiro, são incapazes de enfrentar o problema central dos cofres estatais e expressam interesses de setores rentistas em preservar margens de lucratividade, às custas de enormes
transferências de recursos fiscais para os fundos privados de capital.
A oposição de direita, com importantes adesões ao centro conservador, busca pressionar o governo, por todos os lados, para enterrar o sistema de bem-estar social previsto na Constituição de 1988, cuja construção efetiva tem sido a principal conquista dos governos dirigidos pelo PT.
Faz parte da ofensiva conservadora, portanto, o acirramento da luta de classes, sob a forma de conflito distributivo, com o objetivo de reduzir drasticamente as despesas sociais e preservar os ganhos financeiros, sob a lógica de que essas garantias de rentabilidade seriam alavanca primordial para atração de investimentos, eventualmente complementada com privatizações e desregulamentações, em contraposição aos estímulos prioritários para o mercado interno e o fortalecimento do papel dirigente do Estado.
O Partido dos Trabalhadores refuta abertamente estas concepções e mobilizará todas as energias, ao lado de seus aliados dentro e fora das instituições, para impedir qualquer retrocesso aos tempos neoliberais e à agenda maldita que antecedeu o governo do presidente Lula. O Diretório Nacional, neste sentido, considera extremamente positiva a proposta de reintrodução da CPMF, entre outras iniciativas governamentais que buscam reformar progressivamente o sistema de tributação e preservar os programas sociais estabelecidos desde 2003. Do mesmo modo, apoia a pauta de projetos apresentada pela nossa Bancada, que aponta soluções para o crescimento da arrecadação.
A direção partidária também saúda, por retomar a melhor tradição do debate econômico e colaborar para enfrentar a dominância do pensamento conservador, o documento “Por um Brasil Justo e Democrático”, elaborado por iniciativa da Fundação Perseu Abramo e das entidades: Brasil Debate, Fórum 21, Centro Internacional Celso Furtado, Plataforma Política Social, Le Monde Diplomatique e Rede Desenvolvimentista. As várias contribuições ali apresentadas podem servir de referencial para a formulação de uma nova agenda de desenvolvimento econômico sustentável, que deve presidir o conjunto das políticas macroeconômicas do país.
Neste sentido, consideramos fundamental a retomada do funcionamento pleno do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República, que já se mostrou importante espaço de diálogo social e formulação de políticas para o crescimento econômico do país.
Nesse ambiente, é fundamental a criação de espaços de diálogos setoriais, para que trabalhadores, empresários e governo busquem o fortalecimento das cadeias produtivas, visando o crescimento do emprego, incentivando a inovação, agregando valor à produção com o aumento da qualidade e produtividade.
A afirmação deste rumo programático e a derrota do golpismo não podem se escorar apenas na atual política de alianças e nos atuais métodos de governabilidade. É fundamental construir uma governabilidade mais ampla, enraizada na sociedade. Contribui para isso, também, a intensificação das conferencias temáticas governamentais (Juventude, Mulheres, LGBT, Igualdade Racial, dentre outras), legitima aspiração de participação popular dos movimentos sociais e populares.
Por isso, o PT deve dar todo o apoio à consolidação de uma aliança orgânica dos movimentos sociais, partidos progressistas e defensores da democracia, atualmente encarnada na Frente Brasil Popular (FBP), que possa ser a força propulsora para a renovação do bloco histórico no qual se insere o petismo e demais correntes de esquerda.
Todos os militantes do PT devem se engajar plenamente, em suas cidades e estados, locais de trabalho, estudo ou moradia, para construírem a FBP como espaço organizativo e de mobilização contra o golpismo, por mudanças na política econômica e por um programa de reformas estruturais que permita novo ciclo de avanços para o povo brasileiro.
O Diretório Nacional igualmente conclama toda a militância petista e todos os democratas a defenderem o legado e o papel histórico do ex-presidente Lula, transformado em alvo prioritário de armações que se multiplicam em núcleos da Policia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário vinculados a operações supostamente anticorrupção.
Vazamentos seletivos, prisões abusivas, investigações plenas de atropelo e denúncias baseadas em delações arrancadas a forceps e sem provas comprobatórias, desrespeito ao devido processo legal , ao amplo direto de defesa dos acusados e prerrogativas no exercício profissional de seus defensores, entre outros eventos, revelam a apropriação de destacamentos repressivos e judiciais por grupos subordinadas ao antipetismo, que atuam com o intuito de extinguir o Partido dos Trabalhadores e difamar o maior líder popular da história brasileira.
O Partido dos Trabalhadores, por respeito às instituições republicanas, em defesa da Constituição, e com o intuito de combater efetivamente a corrupção, repele todos os procedimentos que ferem o devido processo legal, ofendem garantias democráticas e representam práticas de exceção. O PT considera essas situações como abomináveis e destinadas à sabotagem política, sempre em aberto conluio com grupos monopolistas de comunicação.
Ataques ao ex-presidente Lula fazem parte da escalada contra conquistas de nosso povo e devem ser rechaçados com o máximo vigor. O combate a estas incursões de ódio, intolerância e mentira, nas ruas e nas instituições, é componente essencial da resistência ao golpismo e ao retrocesso.
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