Editorial - Estadão
Nem guinada à esquerda, nem à direita, nem conversão ao bom senso: o governo da presidente Dilma Rousseff continuará tão incompetente quanto sempre foi, incapaz de autocrítica e de aprender com os próprios erros, a julgar por suas declarações durante café da manhã com jornalistas, em Brasília. Ela prometeu fazer “o possível” para alcançar o resultado fiscal prometido para o ano, um superávit primário – sem a despesa de juros – equivalente a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Para atingir essa meta ela só mencionou aumento de impostos, com a recriação da CPMF, e maior liberdade para gastar, a ser obtida com a Desvinculação de Receitas da União (DRU). Nada foi dito sobre corte de gastos nem se prometeu gestão mais austera ou mais eficiente. Falou-se a respeito da reforma da Previdência – necessária, sem dúvida, mas com efeito de longo prazo e nenhuma relevância para a melhora das contas públicas em 2016. Não ficou claro se a presidente percebe esses detalhes. Parte da receita da CPMF, prometeu a presidente, irá para Estados e municípios e deverá servir para a solução de problemas da saúde, principalmente no Rio de Janeiro. Ela parece atribuir a crise da saúde no Rio, portanto, à escassez de dinheiro. Também isso é típico de sua concepção de governo. A crise nos hospitais fluminenses é evidente consequência de uma péssima gestão, denunciada, em primeiro lugar, pela incapacidade do governo de fixar uma lista razoável e decente de prioridades.
Qualquer administrador com alguma competência – e um mínimo de pudor – ficaria corado só de pensar na hipótese de subordinar a educação e a saúde à existência da CPMF, uma aberração tributária, ou a royalties do petróleo. Não parece o caso, no entanto, de governantes e gestores petistas e de seus aliados.
A presidente negou qualquer conversa com dirigentes do PT sobre uma “guinada à esquerda”. Limitou-se a reconhecer, sem dar importância ao fato, as manifestações petistas a favor de uma reorientação da política econômica. Ao falar sobre o rumo da política, mostrou, de forma um tanto surpreendente, haver aprendido pelo menos uma lição: insistiu na promessa de ajuste das finanças públicas – embora sem se referir a austeridade e revisão dos gastos – e evitou mencionar qualquer novo pacote. Não se vai tirar coelho da cartola, disse a presidente, repetindo palavras do chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, pronunciadas no dia anterior.
Mas é insuficiente insistir nas promessas de arrumação das contas e de combate à inflação. Durante um ano a presidente freou as iniciativas do ministro Joaquim Levy e preferiu as opiniões do ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, escolhido, afinal, como novo ministro da Fazenda. Ao preferir as ideias de Barbosa, a presidente motivou o rebaixamento do País por duas agências de avaliação. Como se nada disso houvesse ocorrido, ela anuncia, agora, a disposição de lutar “com unhas e dentes” para “criar outro ambiente no Brasil, com outras expectativas”. Para isso bastarão, a curto prazo, aumentar impostos e desvincular receitas?
Também demonstrando alguma cautela, a presidente evitou comentar a política de juros, assunto da competência exclusiva, segundo ela, do Banco Central (BC). Ela nunca teve esse cuidado no primeiro mandato e será necessário mais que esse discurso bem comportado para convencer o mercado. A política de juros tem sido discutida tanto na cúpula do PT quanto em áreas do Executivo federal. A evolução recente da curva de juros, no mercado, é um reflexo desse fato bem conhecido.
Para tornar convincente seu discurso a respeito do ajuste fiscal e do combate à inflação, a presidente precisa dar sinais muito claros de ajuste das próprias ideias e inclinações. Sua política em 2015 foi uma reafirmação gradual de fidelidade às ideias do mandato anterior. Tudo isso culminou na substituição do ministro da Fazenda. É necessário muito mais que a entrevista de ontem para indicar uma efetiva mudança de ideias e de rumos.
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