Editorial - Estadão
A presidente Dilma Rousseff acrescentou um feito à sucessão de vexames que têm marcado seu deplorável esperneio contra o fim de carreira que se anuncia próximo: levou um pito público de três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) pela sandice de classificar de golpe o processo de seu impeachment e pelo despautério de cogitar subir à tribuna da ONU para denunciar a conspiração da qual se considera vítima. “Ainda que a senhora presidente da República veja, a partir de uma perspectiva eminentemente pessoal, a existência de um golpe”, afirmou o decano da Suprema Corte, ministro Celso de Mello, “na verdade há um grande e gravíssimo equívoco, porque o Congresso Nacional e o STF deixaram muito claro que o procedimento destinado a apurar a responsabilidade política da presidente da República respeitou, até o presente momento, todas as fórmulas estabelecidas na Constituição.”
O ministro Dias Toffoli, nomeado para o STF pelo então presidente Lula, ex-advogado do PT e ex-advogado-geral da União, foi mais duro: “Alegar que há um golpe em andamento é uma ofensa às instituições brasileiras, e isso pode ter reflexos ruins, inclusive no exterior, porque passa uma imagem ruim do Brasil”.
Por sua vez, o ministro Gilmar Mendes, crítico habitual do governo, enfatizou que o “golpe” denunciado por Dilma é, na verdade um conjunto de “procedimentos absolutamente normais, dentro do quadro de institucionalidade”.
A intenção da presidente de usar a tribuna da ONU para denunciar o “golpe” é tão claramente absurda que foi desaprovada por muitos de seus próprios assessores, embora haja no Palácio do Planalto quem a defenda como parte da estratégia do PT de transformar Dilma e seu partido em vítimas aos olhos do Brasil e do mundo. É uma estratégia que obviamente não busca salvar o mandato da presidente – uma causa que muitos governistas já dão como perdida –, mas construir um enredo político que possibilite a sobrevivência do lulopetismo, se possível com efeitos positivos já nas eleições municipais de outubro e, obviamente, na sucessão presidencial de 2018.
Embora esteja claro que Dilma está mais ou menos entregue à própria sorte pelo PT, é compreensível que ela se disponha a, em sua defesa, como admitiu o ministro Celso de Mello, “alegar aquilo que lhe aprouver”. Mas só mesmo tendo perdido o senso crítico, deixado dominar-se pelo rancor e renunciado a suas responsabilidades como chefe de governo e Estado, Dilma Rousseff poderia pensar em cometer a ofensa às instituições brasileiras apontada pelo ministro Toffoli. E, acrescentando injúria ao insulto, planejar fazê-lo num foro em que representantes de toda a comunidade internacional se reunirão para a solenidade de assinatura do Acordo do Clima (COP-21), resultado do Acordo de Paris.
Só mesmo na manhã de hoje, quando Dilma subir à tribuna das Nações Unidas em Nova York, será possível saber se seu desespero chegará a ponto de expor o Brasil ao vexame de ser apontado por sua própria chefe de Estado como uma republiqueta em que as instituições democráticas estão “em perigo” por conta da ação nefasta de “golpistas” e “traidores”, entre eles os Poderes Legislativo e Judiciário.
Mesmo na hipótese de que um surto de sensatez impeça Dilma de se expor ao ridículo da farsa de vitimização diante de estadistas de todo o mundo, é certo que ela já tem agendadas pelo menos duas entrevistas coletivas a jornalistas, nas quais repetirá a encenação que por duas vezes promoveu esta semana em Brasília. E então admitirá que o Brasil “tem problemas” na economia, mas por nenhum deles ela pode ser responsabilizada, já que os culpados pela devastação do País foram fatores externos e alheios a sua vontade e controle. Mas que nada justifica a ação perversa da oposição, constituída por golpistas desalmados que, não contentes em não deixar o governo governar, agora querem a cadeira que lhe pertence. Logo ela, símbolo de honestidade que viceja no imenso pantanal de escândalos do petrolão.
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