Editorial - Folha de SP
Dado que Michel Temer (PMDB) alocou na Esplanada dos Ministérios figuras acossadas pela Operação Lava Jato, era fácil prever que em algum momento o presidente interino se veria levado a promover mudanças em seu gabinete. Não se imaginava, porém, que precisaria fazê-las antes de completar 20 dias de governo. Depois que conversas comprometedoras reveladas por esta Folha custaram ao senador Romero Jucá (PMDB-RR) a pasta do Planejamento, era simples predizer que as gravações feitas por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, alvejariam outros membros do primeiro escalão de Temer.
Não se antecipava, todavia, que o atingido seria Fabiano Silveira, ministro da Transparência, Fiscalização e Controle (antiga CGU, Controladoria-Geral da União) –um funcionário de carreira do Senado sobre quem não pesavam suspeitas.
Áudios divulgados pelo programa Fantástico, da TV Globo, mostram Silveira criticando a Lava Jato e passando a Machado e ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), orientações sobre como proceder em relação à Procuradoria-Geral da República —ambos são investigados.
Os diálogos seriam do final de fevereiro, quando Silveira integrava o Conselho Nacional de Justiça. Embora não constituam crime, expõem contradições que nenhum governo deveria tolerar.
Como conselheiro do CNJ, Silveira deveria atuar para aperfeiçoar a Justiça, e não prestar assessoria a políticos com pendências judiciais. Como ministro da Transparência, não poderia ter seu nome associado a conchavos sorrateiros e ver posto sob dúvida seu compromisso com o combate à corrupção.
Pelo precedente do caso Jucá, supunha-se que Temer agiria de forma resoluta. Não foi o que aconteceu, contudo. A despeito dos veementes protestos de servidores do órgão de controle e apesar da reação negativa da opinião pública, o presidente interino hesitava.
Talvez temesse se tornar refém de um padrão, mas, acima de tudo, procurava não contrariar Renan, a quem coube indicar o titular do Ministério da Transparência.
Michel Temer depende do presidente do Senado não somente para aprovar medidas centrais de seu pacote econômico mas também para garantir os 54 votos necessários ao impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff (PT).
No equilíbrio precário entre as exigências da opinião pública, que clama por mais ética, e as de muitos senadores, que desejam o oposto, Temer fazia a sua escolha.
A carta de demissão apresentada por Fabiano Silveira salva o presidente interino de um vexame prolongado, mas não afasta a percepção de que o governo Temer é vulnerável à transparência.
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