Editorial - Estadão
O governo de Michel Temer (PMDB) anunciou ontem (24) a diretriz central de seu programa econômico: estabelecer um limite legal para o aumento do gasto público. Mais que um plano de enfrentamento da crise, trata-se de um projeto de redução paulatina do tamanho do Estado —uma bem-vinda proposta de reverter a tendência de quase 30 anos de alta constante de dispêndios e tributos.
Pretende-se que o aumento dos gastos num certo ano não supere a taxa de inflação do ano anterior. Isto é, a despesa seria congelada em termos reais; diminuiria em relação ao PIB com a volta do crescimento econômico.
Se implementado, o plano poderá mudar radicalmente, e para melhor, o trato das contas públicas. Na mesma proporção de sua ambição, porém, surgirão empecilhos no Congresso, onde medidas concretas precisarão ser aprovadas —uma tarefa ainda mais árdua pelo fato de tal programa não ter passado pelo debate eleitoral.
Eis a dificuldade: para o teto funcionar, é necessário conter aumentos ora automáticos de certas despesas, como saúde e educação. Hoje, por força de lei, a verba mínima destinada a essas áreas cresce de acordo com o aumento da receita.
A despesa previdenciária, por sua vez, expande-se à revelia do governante, conforme se amplia o número de beneficiários. Eleva-se, ademais, devido ao reajuste dos benefícios pela inflação e quando há aumento real do salário mínimo, que é o piso da Previdência.
Se não houver mudanças nesses mecanismos, o crescimento de tais desembolsos logo inviabilizará os demais gastos públicos —que estarão limitados pelo teto.
A questão, portanto, envolve uma grande mudança constitucional, com a revisão do Estado de bem-estar social no Brasil.
A fim de não prejudicar serviços essenciais, o governo precisará remanejar verbas, rever iniciativas obsoletas e ganhar eficiência.
Dada a atual diferença entre receita e despesa, o plano não eliminará de imediato o deficit primário. As contas federais devem permanecer no vermelho pelo menos até o próximo governo, a depender de receitas extraordinárias ou de aumentos de impostos.
Por implicar efeitos práticos a médio prazo, a contribuição do programa econômico de Temer para a atenuação da crise depende da aprovação de sua essência: um teto seja viável e crível.
Ainda que se espere outro pacote para enfrentar os problemas de produtividade da economia, o gasto é central; a força do programa ora anunciado deriva apenas da expectativa de que a despesa federal estará sob controle nos próximos anos. Meias medidas representarão apenas meio caminho andado para o fracasso.
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