Editorial - Estadão
Quando se trata de atravancar qualquer iniciativa que possa significar a modernização e a racionalização das relações de trabalho, os chefões dos sindicatos esquecem até mesmo as mais agudas rivalidades políticas que os separam. Sabem que precisam unir forças para manter inalterada uma situação que confere aos sindicatos um enorme poder e abundantes recursos. É por essa razão que as principais centrais sindicais do País começam a se organizar para, em conjunto, impedir que o governo do presidente em exercício Michel Temer leve adiante uma necessária reforma trabalhista. A mais recente adesão a esse movimento é a da Central Única dos Trabalhadores (CUT), braço sindical do PT.
O presidente da CUT, Vagner Freitas, informou que, depois que o processo de impeachment for encerrado, engrossará as fileiras dos que pretendem “negociar” com o governo os termos da reforma – em outras palavras, pressionar o Planalto, sob ameaça de infernizar a vida dos brasileiros em geral com greves e piquetes, para manter a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) exatamente como está, como se o País ainda estivesse na década de 40 do século passado.
“Depois que (o impeachment) passar no Senado, nós vamos negociar, com Temer ou com Dilma”, informou Freitas, segundo o jornal Valor. Pode-se dizer que tal disposição – ainda que o verbo “negociar”, na boca dos capi da CUT, frequentemente tenha o mesmo sentido que “chantagear” – é uma mudança significativa em relação às atitudes dos sindicalistas do PT até aqui. Em primeiro lugar, o líder da CUT admite conversar com Temer, cujo governo a central diz considerar “ilegítimo” e contra quem Vagner Freitas havia prometido mobilizar os trabalhadores para “ir para as ruas entrincheirados, com armas na mão”, caso o impeachment avançasse. Agora, ao aceitar “negociar” com Temer, Freitas sinaliza que a CUT reconhecerá o governo do peemedebista, abandonando, na prática, a patacoada segundo a qual está em curso um “golpe” contra a presidente Dilma Rousseff.
No entanto, o que poderia ser sintoma de amadurecimento da CUT nada mais é do que o recorrente oportunismo sindical. Diante da constatação de que as demais centrais sindicais já estão na mesa de negociação com Temer há algum tempo, a CUT parece ter percebido que ficaria isolada, sem nenhuma influência sobre os desdobramentos desse processo, restando-lhe a patética defesa de Dilma, por quem, aliás, os sindicalistas do PT jamais morreram de amores.
Nos cálculos da CUT, portanto, a eventual lealdade que a central ainda pudesse nutrir em relação à governante petista foi preterida pelo mister de preservar seu poder. E isso implica juntar-se a velhos rivais, especialmente a Força Sindical, com quem a CUT disputa espaço desde os anos 90, quase sempre em campos políticos opostos.
Agora mesmo, enquanto a CUT jurava defender Dilma com unhas e dentes, a Força Sindical alinhava-se a Temer. Mas, sendo esse o sindicalismo de resultados, nem tudo é tão simples. Do mesmo modo que a CUT começa a abandonar Dilma, o apoio da Força Sindical a Temer muitas vezes se assemelha a oposição, com direito inclusive a ameaças de greve geral.
Tudo isso porque o governo Temer pretende encaminhar ao Congresso uma proposta de reforma que atualize a CLT, para fazer a legislação acompanhar a modernização tecnológica, que alterou as relações de trabalho, e privilegiar o negociado em relação ao legislado, fortalecendo a negociação coletiva e permitindo que cada setor produtivo encontre as melhores soluções para cada caso.
É claro que uma reforma assim, se levada adiante, pode representar risco para o poder quase imperial que as centrais sindicais exercem sobre o mercado de trabalho. Para essa turma, pouco importa se as mudanças visam a criar mais empregos, pois a preocupação dos sindicatos não é com os 11 milhões de desempregados atualmente no País, e sim com a manutenção de um sistema que lhes dá o monopólio da negociação trabalhista e é sustentado, na marra, pelos assalariados, gente que, ao contrário dos sindicalistas, tem de trabalhar para viver.
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