Editorial - Folha de SP
Quando se caminha dos embates retóricos rumo a propostas concretas de reforma da Previdência Social, uma primeira constatação é que há não apenas uma, mas diversas previdências a reformar. Assalariados com carteira assinada submetem-se a um regime geral que prevê aposentadorias por idade (65 anos para homens e 60 para mulheres), por tempo de contribuição (35 ou 30 anos, conforme o gênero) ou pela soma das duas condições (95 ou 85 anos).
Tais possibilidades incluem o Brasil num diminuto grupo de 13 países que autorizam a concessão do benefício sem critério de idade mínima, conforme estudo publicado pelo Ipea. Celetistas, entretanto, não terão dificuldade em apontar privilégios nas demais categorias.
Trabalhadores rurais podem aposentar-se cinco anos mais cedo, quase sem exigência de contribuições comprovadas, em modelo assemelhado à assistência social.
Entre funcionários públicos, dos quais se exige idade mínima de 55 (mulheres) ou 60 anos (homens), a grande maioria ainda tem direito a benefícios equivalentes aos salários da ativa, ou de valor próximo. Novos servidores civis perderam tal regalia; militares, não.
Na soma das partes, tem-se um sistema ao mesmo tempo iníquo e perdulário. Em comum, todos os regimes —e suas dezenas de regras e modalidades especiais— demandarão recursos crescentes da sociedade para despesas não cobertas pelos aportes dos segurados.
Só no ano passado, a previdência rural contabilizou deficit de astronômicos R$ 91 bilhões; a dos servidores federais civis, de R$ 40 bilhões; a dos militares, de R$ 32,5 bilhões. No regime ainda superavitário dos celetistas urbanos, o saldo despencou de R$ 25,3 bilhões para R$ 5,1 bilhões.
Não espanta que o governo, sem ter mais como procrastinar uma reforma, incline-se pela unificação das normas previdenciárias. Esboçou-se a proposta no início do ano, ainda sob a presidente Dilma Rousseff (PT), hoje afastada, e a equipe do interino, Michel Temer (PMDB), agora a retoma.
Os objetivos não se limitam à correção de injustiças. A imposição a homens e mulheres, nos setores público e privado, de uma idade mínima condizente com a expectativa de vida nacional sustaria a sangria das aposentadorias precoces. Além disso, a cobrança de contribuições do setor agrícola daria alento às receitas.
Do ângulo político, o risco é desagradar a todos ao mesmo tempo —num país em que, como mostrou pesquisa Datafolha, a maioria almeja aposentar-se aos 60 anos.
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