Ela tinha 15 anos quando passou 26 dias presa com cerca de 30 homens em uma cadeia de Abaetetuba, no Pará. A adolescente sofreu torturas e estupros diários. Seus cabelos foram cortados para que parecesse homem e não chamasse a atenção de quem passasse perto da cela.
Nove anos após o episódio, ocorrido em 2007, a jovem leva uma vida desprotegida, de privações e medo, a mais de 3.000 km do Pará.
Aos 24 anos, ela parou de estudar, não tem profissão fixa, foi afastada de programas de proteção, convive com o crack e teme ser morta por traficantes, segundo relato de pessoas próximas a ela.
A reportagem usa nomes fictícios dos entrevistados para não identificar a jovem nem a cidade onde mora.
O drama da garota, que se tornou um marco na luta por direitos humanos nas cadeias brasileiras, voltou à tona no mês passado, quando o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) puniu a juíza Clarice Maria de Andrade, que atuou no caso, afastando-a da magistratura por dois anos.
Segundo o CNJ, ela foi negligente porque só "encaminhou ofício à Corregedoria de Justiça do Pará pedindo a transferência [da garota] para um estabelecimento prisional adequado" duas semanas após receber "ofício da autoridade policial".
A juíza não dá entrevista sobre o ocorrido. Ela disse à Folha, via assessoria, que o caso está sob segredo de Justiça e que sua defesa está sendo feita pelos advogados da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros). A entidade divulgou nota dizendo que vai recorrer da decisão do CNJ por considerá-la "desproporcional".
Já a jovem, descrita por conhecidos como "explosiva" e "revoltada", evita falar do ocorrido naquela cela. "O que ela sofreu é tão desumano que eu não sei se ela um dia vai se recuperar. Eu, no lugar dela, teria morrido", diz Renata, funcionária de uma ONG que a atendeu.
Laura, voluntária de uma ação social, afirma que a moça tem hoje o perfil de quem vive na rua, com corpo magro e debilitado e sem hora para comer nem para dormir.
A jovem, conta a voluntária, "é amorosa com todos", mas costuma ser "agressiva quando se sente rechaçada, humilhada". "Ela não fica muito tempo no mesmo barraco. Não acumula coisas. Usa crack e socializa com sua tribo. É uma criança de rua."
A garota vive afastada da família –os pais também tiveram de deixar o Pará em 2007. Segundo relato de conhecidos, o convívio com os parentes já era difícil antes da detenção em Abaetetuba, mas a jovem diz amá-los.
Nove anos após o episódio, ocorrido em 2007, a jovem leva uma vida desprotegida, de privações e medo, a mais de 3.000 km do Pará.
Aos 24 anos, ela parou de estudar, não tem profissão fixa, foi afastada de programas de proteção, convive com o crack e teme ser morta por traficantes, segundo relato de pessoas próximas a ela.
A reportagem usa nomes fictícios dos entrevistados para não identificar a jovem nem a cidade onde mora.
O drama da garota, que se tornou um marco na luta por direitos humanos nas cadeias brasileiras, voltou à tona no mês passado, quando o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) puniu a juíza Clarice Maria de Andrade, que atuou no caso, afastando-a da magistratura por dois anos.
Segundo o CNJ, ela foi negligente porque só "encaminhou ofício à Corregedoria de Justiça do Pará pedindo a transferência [da garota] para um estabelecimento prisional adequado" duas semanas após receber "ofício da autoridade policial".
A juíza não dá entrevista sobre o ocorrido. Ela disse à Folha, via assessoria, que o caso está sob segredo de Justiça e que sua defesa está sendo feita pelos advogados da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros). A entidade divulgou nota dizendo que vai recorrer da decisão do CNJ por considerá-la "desproporcional".
Já a jovem, descrita por conhecidos como "explosiva" e "revoltada", evita falar do ocorrido naquela cela. "O que ela sofreu é tão desumano que eu não sei se ela um dia vai se recuperar. Eu, no lugar dela, teria morrido", diz Renata, funcionária de uma ONG que a atendeu.
Laura, voluntária de uma ação social, afirma que a moça tem hoje o perfil de quem vive na rua, com corpo magro e debilitado e sem hora para comer nem para dormir.
A jovem, conta a voluntária, "é amorosa com todos", mas costuma ser "agressiva quando se sente rechaçada, humilhada". "Ela não fica muito tempo no mesmo barraco. Não acumula coisas. Usa crack e socializa com sua tribo. É uma criança de rua."
A garota vive afastada da família –os pais também tiveram de deixar o Pará em 2007. Segundo relato de conhecidos, o convívio com os parentes já era difícil antes da detenção em Abaetetuba, mas a jovem diz amá-los.
Furto de celular - A adolescente foi apreendida no dia 21 de outubro de 2007 após tentar furtar um celular. À época, com 15 anos, acumulava três passagens pela polícia. Segundo denúncia encaminhada à Justiça, a adolescente foi trancada no banheiro pelo dono da casa, sendo agredida "com um soco no estômago" pelos policiais chamados ao local.
Na delegacia, ainda de acordo com a denúncia, a delegada de plantão lavrou o auto de prisão em flagrante sem conferir idade e identidade.
Levada à cela com cerca de 30 homens, o martírio só acabou quando um preso da delegacia foi solto e acionou o Conselho Tutelar.
O Ministério Público Estadual denunciou cinco delegados, três agentes prisionais e dois investigadores por crimes como lesão corporal, ameaça e tortura. Dois presos foram denunciados por estupro.
Procurado, o TJ (Tribunal de Justiça) do Pará não quis dar detalhes por o caso estar sob segredo de Justiça. Via assessoria, informou apenas que quatro delegados demitidos após procedimento administrativo disciplinar tentaram retomar os cargos, mas os pedidos não foram aceitos pela Justiça. Eles recorreram. O caso está no STJ (Superior Tribunal de Justiça).
DROGAS
A garota hoje vive no Sul do país -para preservá-la, a reportagem não revela o Estado. Chegou à região por meio de programas de proteção, mas está desligada deles.
Antes, passou por clínicas terapêuticas e centros para menores infratores de cidades como Brasília, onde colecionou fugas e pequenos crimes para comprar crack.
Já no Sul, viveu relacionamentos amorosos difíceis, inclusive com um rapaz preso por roubo. Chegou a ser detida sob acusação de assalto depois de investida contra um posto de combustíveis,
de onde foram levados R$ 18 mil -no julgamento, ela foi considerada inocente.
Pedro, advogado que a defendeu no episódio, diz que a jovem, explosiva e dependente de crack, "de vez em quando liga para pedir ajuda". "Uma vez ela me ligou do centro da cidade me pedindo socorro. Quando cheguei lá, ela não estava mais. Ela é assim, sem rumo."
Cláudia, coordenadora de um dos programas que a acolheu anos atrás, afirma que a jovem foi afastada porque se colocava em situação de vulnerabilidade. "Na última vez que a vi, ela estava feliz, me abraçou. Mas logo saiu porque achou que tinha gente [traficante] atrás dela."
Outras três pessoas que se sensibilizaram com o caso dela e tentam monitorar seus passos dizem que frequentemente perdem contato com a garota. "Ela é muito revoltada com tudo o que aconteceu. A dor que passou é algo sem tamanho", disse Maria, voluntária de uma ONG.
Segundo o governo do Pará, desde maio de 2011 o Estado paga pensão mensal de dois salários mínimos diretamente para a jovem a título de indenização. O governo afirma ainda que já concordou em pagar "o valor de R$ 85 mil", também como indenização, mas não há data definida para isso. "O Estado aguarda a emissão dos boletos do precatório para realizar o pagamento", informou por meio da assessoria.
Na delegacia, ainda de acordo com a denúncia, a delegada de plantão lavrou o auto de prisão em flagrante sem conferir idade e identidade.
Levada à cela com cerca de 30 homens, o martírio só acabou quando um preso da delegacia foi solto e acionou o Conselho Tutelar.
O Ministério Público Estadual denunciou cinco delegados, três agentes prisionais e dois investigadores por crimes como lesão corporal, ameaça e tortura. Dois presos foram denunciados por estupro.
Procurado, o TJ (Tribunal de Justiça) do Pará não quis dar detalhes por o caso estar sob segredo de Justiça. Via assessoria, informou apenas que quatro delegados demitidos após procedimento administrativo disciplinar tentaram retomar os cargos, mas os pedidos não foram aceitos pela Justiça. Eles recorreram. O caso está no STJ (Superior Tribunal de Justiça).
DROGAS
A garota hoje vive no Sul do país -para preservá-la, a reportagem não revela o Estado. Chegou à região por meio de programas de proteção, mas está desligada deles.
Antes, passou por clínicas terapêuticas e centros para menores infratores de cidades como Brasília, onde colecionou fugas e pequenos crimes para comprar crack.
Já no Sul, viveu relacionamentos amorosos difíceis, inclusive com um rapaz preso por roubo. Chegou a ser detida sob acusação de assalto depois de investida contra um posto de combustíveis,
de onde foram levados R$ 18 mil -no julgamento, ela foi considerada inocente.
Pedro, advogado que a defendeu no episódio, diz que a jovem, explosiva e dependente de crack, "de vez em quando liga para pedir ajuda". "Uma vez ela me ligou do centro da cidade me pedindo socorro. Quando cheguei lá, ela não estava mais. Ela é assim, sem rumo."
Cláudia, coordenadora de um dos programas que a acolheu anos atrás, afirma que a jovem foi afastada porque se colocava em situação de vulnerabilidade. "Na última vez que a vi, ela estava feliz, me abraçou. Mas logo saiu porque achou que tinha gente [traficante] atrás dela."
Outras três pessoas que se sensibilizaram com o caso dela e tentam monitorar seus passos dizem que frequentemente perdem contato com a garota. "Ela é muito revoltada com tudo o que aconteceu. A dor que passou é algo sem tamanho", disse Maria, voluntária de uma ONG.
Segundo o governo do Pará, desde maio de 2011 o Estado paga pensão mensal de dois salários mínimos diretamente para a jovem a título de indenização. O governo afirma ainda que já concordou em pagar "o valor de R$ 85 mil", também como indenização, mas não há data definida para isso. "O Estado aguarda a emissão dos boletos do precatório para realizar o pagamento", informou por meio da assessoria.
Nenhum comentário:
Postar um comentário