A adolescente, suspeita de furto, dividiu a cela com cerca de 30 homens na delegacia de polícia de Abaetetuba, em novembro de 2007, sendo espancada e estuprada. Três anos depois, o CNJ chegou a aplicar aposentadoria compulsória à juíza, por entender que ela havia homologado a prisão em flagrante mesmo tendo conhecimento das condições irregulares do local.
A medida foi anulada em 2012, quando o STF concluiu que os documentos levados a Clarice de Andrade na época não informavam a presença da garota no mesmo espaço que presos do sexo masculino. Marco Aurélio, relator daquele acórdão, afastou a imputação de desídia ou dolo e determinou que o CNJ deveria analisar apenas se a juíza praticou falsidade ideológica na assinatura de um documento — ela afirma que determinou expedição de ofício sobre o caso à Corregedoria de Justiça, mas a data está rasurada.
O processo administrativo disciplinar voltou à pauta do conselho em outubro do ano passado, levando à pena de disponibilidade (quando o magistrado fica proibido de exercer suas funções por ao menos dois anos, recebendo vencimentos proporcionais). A defesa foi então ao STF, alegando que os conselheiros voltaram a analisar a desídia.
O voto do relator, Arnaldo Hossepian, diz que Clarice “abdicou deliberadamente do exercício de suas competências, atuando de forma burocrática e indolente, negligenciando em salvaguardar os interesses da mulher e, num segundo momento, de menor inimputável”, além de ter transferido a responsabilidade de inação a um servidor.
Marco Aurélio afirmou que, embora o CNJ tenha citado a decisão anterior do STF, foi contraditório ao imputar a prática de conduta desidiosa. “Assento a existência de perigo de dano a justificar o implemento da medida acauteladora [liminar], decorrente do fato de a impetrante [...] ter sido afastada das funções”, escreveu o ministro.
Dupla gravidade
Para o advogado Emiliano Alves Aguiar, que defende a juíza, a violação aos direitos da adolescente não pode levar à punição de uma magistrada sem responsabilidade pelo episódio. Ele afirma que a cliente não sabia da prisão com outros homens e foi provocada para apreciar o flagrante de uma mulher maior de idade, pois a jovem tinha uma identidade falsa.
Sobre a suspeita de falsidade ideológica, Aguiar — sócio do Gordilho, Pavie e Aguiar Advogados — diz que uma perícia já demonstrou que não houve intenção de camuflar a data correta. Ainda segundo ele, Clarice de Andrade é hoje titular da 1ª Vara Criminal de Belém e tem comportamento exemplar, cumprindo metas do Judiciário.
Em 2010, a Justiça do Pará condenou à prisão cinco delegados responsáveis pela carceragem. Pelo menos quatro haviam sido exonerados. Clique aqui para ler a decisão.
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