Editorial - Folha de SP
A despeito de ser uma das iniciativas mais bem-sucedidas da política social do país, o Bolsa Família suscita tanto questionamentos pertinentes quanto críticas baseadas em pouco mais do que suposições. Muito se falou, por exemplo, no risco de o programa estimular a natalidade em meio a sua clientela, dado que os pagamentos são proporcionais ao número de filhos.
Ou, mais ainda, no eventual incentivo ao abandono do mercado de trabalho pelos mais carentes, que poderiam optar por viver apenas da ajuda governamental.
Ao longo de 13 anos desde a criação do Bolsa Família, diversos estudos debruçaram-se sobre tais conjecturas, sem achar dados que as confirmassem. Ainda que se possam mencionar episódios pontuais a elas relacionados, nada indica uma tendência de larga escala.
Sob condições como a matrícula das crianças em escolas e cuidados médicos, o programa transfere não mais que R$ 179 ao mês, em média, a 13,6 milhões de famílias. Não é, convenha-se, valor que encoraje uma vida de ócio remunerado.
Uma hipótese mais sofisticada, no entanto, é que esses benefícios assistenciais elevem a informalidade no mercado de trabalho —ou seja, que trabalhadores prefiram empregos sem carteira assinada para ocultar seus rendimentos e não perder o direito ao amparo oficial.
O ministro Osmar Terra, do Desenvolvimento Social, encampou tal visão, ao anunciar ofensiva para incluir a clientela do Bolsa Família no mercado formal.
Sem alterar o teto para ingresso no programa (renda familiar per capita até R$ 170 mensais), pretende-se ampliar as possibilidades para que beneficiários que superaram tal patamar recebam pagamentos por mais dois anos, em vez de serem desligados.
Cogita-se liberar a extensão temporária do benefício para famílias com renda até um salário mínimo (R$ 937 ao mês) por membro —o dobro do estipulado na regra atual. "Vai ser um dos maiores processos de formalização do trabalhador no país", disse Terra.
A medida tem sua razão de ser, uma vez que existe um risco em abrir mão da bolsa por um emprego que pode não ser duradouro. Tanto melhor se vier acompanhada de providências para a emancipação econômica dos atendidos.
O ministro erra, porém, ao propagar tamanha expectativa de resultados sem apresentar estudos que a fundamentem. Acaba-se, assim, fomentando mais uma ideia preconceituosa a respeito do comportamento das pessoas carentes.
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