Editorial - Estadão
Ao negar na quarta-feira passada prosseguimento à denúncia contra o presidente da República, a Câmara dos Deputados abriu caminho para a continuidade das reformas, especialmente a da Previdência e a política. No entanto, parece que alguns parlamentares viram no novo cenário político tão somente uma oportunidade para barganhar e, conforme relata reportagem do Estado, querem aprovar, com a máxima urgência, a criação de um novo fundo, feito com dinheiro público, para financiar campanhas políticas. Alheios ao interesse do País e ao estado das contas públicas, eles têm a desfaçatez de apresentar a interesseira manobra, que pode vir a custar até R$ 6 bilhões, como parte da reforma política e ainda chantageiam, dizendo que a destinação desses novos recursos públicos aos partidos será condição para a aprovação da reforma previdenciária. Logicamente, a criação de um novo fundo público para campanhas políticas não faz parte da necessária e urgente reforma política. Destinar mais dinheiro público aos partidos políticos é simplesmente agravar a atual situação de distanciamento entre política e sociedade. O que faz falta é, por exemplo, modificar extensa e profundamente o sistema partidário, garantindo um mínimo de densidade ideológica e programática e de conexão com a população. Outra área que merece pronta reforma é o pacto federativo, para que suas regras de funcionamento expressem um mínimo de equilíbrio entre autonomia e responsabilidade de cada ente federativo. Também é preciso discutir com seriedade a oportunidade de se adotar o sistema parlamentarista de governo.
Já existem no Congresso, deve-se reconhecer, algumas propostas capazes de contribuir para a reforma política, a começar pela cláusula de desempenho para os partidos políticos e o fim das coligações nas eleições proporcionais. Ainda que insuficientes, elas podem ajudar a diminuir o número de partidos nanicos, que só servem a seus caciques e transformam a política num balcão de negócios. Pois, ao contrário do que muitos pensam, a criação de partidos não ajuda a renovação do ambiente político. São os hábitos e costumes que precisam mudar. Afinal, a cada eleição tem-se uma renovação da Câmara, por exemplo, da ordem de 40% de seus membros, e nem por isso a política se regenera. Tais alterações não têm qualquer vinculação com a proposta de novo fundo público para as campanhas eleitorais. Sua aprovação só serviria para manter o perverso sistema de partidos – que são entidades privadas – sustentados com dinheiro do Estado.
Diante da atual crise, não há espaço para barganhas nem para falsas disjuntivas. As duas reformas – a política e a da Previdência – são importantes e é preciso que sejam implementadas de verdade. Por exemplo, a reforma da Previdência não se resume a alterar algumas regras. Ou se instala um novo equilíbrio entre receitas e despesas previdenciárias ou se estaria tão somente a lograr a população. O mesmo raciocínio aplica-se à reforma política. Suas alterações devem colaborar para uma real melhora do sistema político. Para ser uma manobra que atenda, por outros caminhos, aos nefastos interesses de sempre é preferível não mudar nada.
Engana-se quem julga não haver condições para reformas reais no País. O Congresso foi capaz de aprovar a reforma trabalhista em momento de muito maior instabilidade política que o atual, quando ainda estava pendente de análise a denúncia contra o presidente Michel Temer. Trata-se, portanto, de uma perigosa ilusão, que só favorece os que lucram com os atuais descaminhos do País, achar que a solução dos problemas que assolam a vida dos brasileiros deve ser buscada quando a crise estiver amainada.
A ocasião mais propícia para as reformas é agora, pois a crise revela, em toda sua nitidez, a necessidade e a urgência de um novo marco legislativo em áreas vitais do Estado.
Adiar as reformas é atrasar a saída da crise, pois são elas o caminho para tirar o País desse enrosco no qual o PT o colocou de forma deliberada, ao manejar as instituições e perverter as relações políticas para seus fins particulares. É mais do que hora de atuar na vida pública com decência. Dinheiro do contribuinte para bancar campanhas luxuosas é uma tremenda indecência.
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