Editorial - Folha de SP
Seguindo orientações do papa Francisco, o Catecismo da Igreja Católica, compêndio oficial da doutrina da maior denominação cristã do planeta, passou a tratar a pena de morte como inadmissível. Sentenciar um ser humano à morte constitui um “ataque à inviolabilidade e dignidade das pessoas”, diz a nova versão do texto.
Quando se compara Francisco com seus antecessores mais recentes, não se está diante de uma revolução a respeito do tema —décadas atrás, João Paulo 2º (papa de 1978 a 2005) já apontava nessa direção. Mas há, de fato, um abismo entre a posição do pontífice argentino e a que prevaleceu historicamente no pensamento católico.
Com efeito, embora o cristianismo primitivo tenha sido marcado pelas exortações de Jesus a “não resistir ao mal”, “oferecer a outra face” e “amar os inimigos”, a passagem de movimento minoritário a religião oficial do Estado romano levou teólogos a repensarem esse ideário não violento.
Inspirados no Antigo Testamento, que prescrevia a pena capital para certos pecados, como o assassinato, a adoração a deuses pagãos e atos homossexuais, pensadores como santo Agostinho (século 4º d.C.) defenderam que autoridades legítimas poderiam executar malfeitores, ou mesmo fazer guerras segundo a vontade divina.
Com pequenas variações, esse foi o ponto de vista que prevaleceu durante séculos. Nas últimas décadas, porém, dois movimentos ajudaram a preparar o caminho para a mudança agora anunciada.
De um lado, a maior abertura ao diálogo com a modernidade levou a Igreja Católica a abraçar a ideia de direitos humanos universais, sobre a qual, até então, tinha reservas.
De outro, o chamado retorno às fontes do cristianismo primitivo fez com que se desse mais peso aos ensinamentos literais dos Evangelhos —e menos a uma tradição segundo a qual o principal dever era apoiar a punição de quem ameaçasse o bem comum.
Tanto João Paulo 2º quanto Francisco, este com mais veemência, ressaltaram que os tempos mudaram para melhor. Com o avanço do sistema penal, a justificativa para executar um ser humano —a de proteger outras pessoas da violência— deixa de existir, uma vez que se mostra possível atingir esse fim sem tirar mais uma vida.
É curioso que algumas das reações mais fortes contra a nova tese tenham vindo de católicos americanos politicamente conservadores, contrários ao aborto e favoráveis à pena de morte. Ao menos desse ponto de vista, a decisão de Francisco mostra que reduzir a conduta da Igreja a um tipo de orientação ideológica é simplificador.
Seguindo orientações do papa Francisco, o Catecismo da Igreja Católica, compêndio oficial da doutrina da maior denominação cristã do planeta, passou a tratar a pena de morte como inadmissível. Sentenciar um ser humano à morte constitui um “ataque à inviolabilidade e dignidade das pessoas”, diz a nova versão do texto.
Quando se compara Francisco com seus antecessores mais recentes, não se está diante de uma revolução a respeito do tema —décadas atrás, João Paulo 2º (papa de 1978 a 2005) já apontava nessa direção. Mas há, de fato, um abismo entre a posição do pontífice argentino e a que prevaleceu historicamente no pensamento católico.
Com efeito, embora o cristianismo primitivo tenha sido marcado pelas exortações de Jesus a “não resistir ao mal”, “oferecer a outra face” e “amar os inimigos”, a passagem de movimento minoritário a religião oficial do Estado romano levou teólogos a repensarem esse ideário não violento.
Inspirados no Antigo Testamento, que prescrevia a pena capital para certos pecados, como o assassinato, a adoração a deuses pagãos e atos homossexuais, pensadores como santo Agostinho (século 4º d.C.) defenderam que autoridades legítimas poderiam executar malfeitores, ou mesmo fazer guerras segundo a vontade divina.
Com pequenas variações, esse foi o ponto de vista que prevaleceu durante séculos. Nas últimas décadas, porém, dois movimentos ajudaram a preparar o caminho para a mudança agora anunciada.
De um lado, a maior abertura ao diálogo com a modernidade levou a Igreja Católica a abraçar a ideia de direitos humanos universais, sobre a qual, até então, tinha reservas.
De outro, o chamado retorno às fontes do cristianismo primitivo fez com que se desse mais peso aos ensinamentos literais dos Evangelhos —e menos a uma tradição segundo a qual o principal dever era apoiar a punição de quem ameaçasse o bem comum.
Tanto João Paulo 2º quanto Francisco, este com mais veemência, ressaltaram que os tempos mudaram para melhor. Com o avanço do sistema penal, a justificativa para executar um ser humano —a de proteger outras pessoas da violência— deixa de existir, uma vez que se mostra possível atingir esse fim sem tirar mais uma vida.
É curioso que algumas das reações mais fortes contra a nova tese tenham vindo de católicos americanos politicamente conservadores, contrários ao aborto e favoráveis à pena de morte. Ao menos desse ponto de vista, a decisão de Francisco mostra que reduzir a conduta da Igreja a um tipo de orientação ideológica é simplificador.
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