Senado pode votar de pé ou de joelho
Por Reinaldo Azevedo
O Senado terá um papel central na definição da qualidade da democracia brasileira e, por consequência, na sobrevivência de um regime que mereça essa designação. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), em particular, escolherá como quer entrar para a história.
E essa história vai passar pelas respectivas indicações do procurador-geral da República, do embaixador do Brasil nos EUA e dos dois nomes que integrarão o Supremo Tribunal Federal.
Já escrevi e afirmei algumas vezes que o presidente Jair Bolsonaro tem ao menos uma virtude, que, ao se exercer, elimina a esperança de que outras possam existir: ele é sincero ao expor as suas utopias.
Na quarta-feira (14), por exemplo, discursou em Parnaíba, no Piauí: “Nós vamos acabar com o cocô no Brasil: o cocô é essa raça de corrupto e comunista.”
E ele tem um sonho: “Nas próximas eleições, nós vamos varrer essa turma vermelha do Brasil. Já que, na Venezuela, tá bom, vamos mandar essa cambada pra lá. Quem quiser um pouquinho mais para o norte, vai até Cuba. Lá deve ser muito bom também.”
O Senado terá de avaliar se a futura indicação para a PGR terá como parâmetro a Constituição e demais regras do jogo ou se o presidente busca um perseguidor-geral da República.
Que fique claro: o titular do cargo tem, sim, poderes para atender ao ânimo profilático e higienista do presidente. E convém que os não esquerdistas evitem caminhar confiantes para a guilhotina. É “vermelho e cocô” quem Bolsonoro decidir que é “vermelho e cocô”.
Perguntem, senhores senadores, a Gustavo Bebianno ou a Carlos Alberto dos Santos Cruz quanto vale a lealdade do grande líder.
Dois garantistas do Supremo, tão distintos entre si, deixam a Casa: Celso de Mello sai no ano que vem, e Marco Aurélio, no seguinte. E, também nas indicações dos respectivos substitutos, a qualidade da democracia brasileira estará em questão.
O Senado, como instituição —eram outras as composições— já errou e se omitiu o suficiente por ocasião de algumas indicações feitas por Dilma Rousseff.
Lembro-me de um debate que se tornou, a esta altura, bizantino sobre se a Turquia dos primeiros anos de Recep Erdogan estaria inventando uma “democracia à turca”, que alguns finórios ousavam qualificar de “iliberal”.
A “democracia iliberal” é o terraplanismo da teoria política; é a chance que se dá aos truculentos de considerar que é matéria de crença esse negócio de que a soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado a hipotenusa.
Desde o princípio do “erdoganismo”, sustentei que não se construía uma “democracia à turca”, mas uma “ditadura à turca”. Bingo! “Democracia iliberal” é coisa de pilantras ou de idiotas.
E os idiotas, com a imodéstia que tão bem os caracteriza, estão por aí —inclusive na imprensa— a piscar os olhos, como “os moços de fretes” (Fernando Pessoa), para os arreganhos autoritários de Bolsonaro.
O “Mito” tem ancestrais ideológicos com os quais a idiotia de então julgava ser possível conviver e que supunha controláveis. Não associavam adversários a excrementos, mas a ratos. Alcolumbre, um judeu, deve saber do que falo.
Quando tinham de fazer a caricatura dos inimigos, preferiam se fixar no tamanho de seus respectivos narizes, sobre os quais criaram uma tipologia.
O nosso presidente prefere se referir ao tamanho do crânio dos nordestinos. Já deixou claro que se sente oprimido pelo “politicamente correto”. Em Parnaíba, voltou à carga: “Não tenho cabeça grande, mas sou cabra da peste”.
Ninguém, no Senado, tem o direito de duvidar das suas pretensões. Convém acreditar no que diz. Quem não está com ele é cocô e tem de ser excretado. Do país!
Os que não se subordinam a seu projeto pertencem à “turma vermelha”. Até o general da reserva Luiz Rocha Paiva, um linha-dura, pode virar um “melancia” caso não lhe faça mesuras.
E, claro!, é preciso que a Casa decida com as pernas e a coluna eretas se a trajetória e a militância de Eduardo Bolsonaro são compatíveis com a de um embaixador, que tem por tarefa representar o conjunto de brasileiros, não uma facção, uma seita ou uma família que se pretende uma dinastia.
Nem é necessário número tão grande para que o Senado preserve, no que lhe cabe, a sanidade da democracia: o país precisa de 41 brasileiros com vergonha na cara. Só a Grande Paraíba conta com 27 votos de pessoas que Bolsonaro julga ter um crânio diferente do seu.
Por Reinaldo Azevedo
O Senado terá um papel central na definição da qualidade da democracia brasileira e, por consequência, na sobrevivência de um regime que mereça essa designação. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), em particular, escolherá como quer entrar para a história.
E essa história vai passar pelas respectivas indicações do procurador-geral da República, do embaixador do Brasil nos EUA e dos dois nomes que integrarão o Supremo Tribunal Federal.
Já escrevi e afirmei algumas vezes que o presidente Jair Bolsonaro tem ao menos uma virtude, que, ao se exercer, elimina a esperança de que outras possam existir: ele é sincero ao expor as suas utopias.
Na quarta-feira (14), por exemplo, discursou em Parnaíba, no Piauí: “Nós vamos acabar com o cocô no Brasil: o cocô é essa raça de corrupto e comunista.”
E ele tem um sonho: “Nas próximas eleições, nós vamos varrer essa turma vermelha do Brasil. Já que, na Venezuela, tá bom, vamos mandar essa cambada pra lá. Quem quiser um pouquinho mais para o norte, vai até Cuba. Lá deve ser muito bom também.”
O Senado terá de avaliar se a futura indicação para a PGR terá como parâmetro a Constituição e demais regras do jogo ou se o presidente busca um perseguidor-geral da República.
Que fique claro: o titular do cargo tem, sim, poderes para atender ao ânimo profilático e higienista do presidente. E convém que os não esquerdistas evitem caminhar confiantes para a guilhotina. É “vermelho e cocô” quem Bolsonoro decidir que é “vermelho e cocô”.
Perguntem, senhores senadores, a Gustavo Bebianno ou a Carlos Alberto dos Santos Cruz quanto vale a lealdade do grande líder.
Dois garantistas do Supremo, tão distintos entre si, deixam a Casa: Celso de Mello sai no ano que vem, e Marco Aurélio, no seguinte. E, também nas indicações dos respectivos substitutos, a qualidade da democracia brasileira estará em questão.
O Senado, como instituição —eram outras as composições— já errou e se omitiu o suficiente por ocasião de algumas indicações feitas por Dilma Rousseff.
Lembro-me de um debate que se tornou, a esta altura, bizantino sobre se a Turquia dos primeiros anos de Recep Erdogan estaria inventando uma “democracia à turca”, que alguns finórios ousavam qualificar de “iliberal”.
A “democracia iliberal” é o terraplanismo da teoria política; é a chance que se dá aos truculentos de considerar que é matéria de crença esse negócio de que a soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado a hipotenusa.
Desde o princípio do “erdoganismo”, sustentei que não se construía uma “democracia à turca”, mas uma “ditadura à turca”. Bingo! “Democracia iliberal” é coisa de pilantras ou de idiotas.
E os idiotas, com a imodéstia que tão bem os caracteriza, estão por aí —inclusive na imprensa— a piscar os olhos, como “os moços de fretes” (Fernando Pessoa), para os arreganhos autoritários de Bolsonaro.
O “Mito” tem ancestrais ideológicos com os quais a idiotia de então julgava ser possível conviver e que supunha controláveis. Não associavam adversários a excrementos, mas a ratos. Alcolumbre, um judeu, deve saber do que falo.
Quando tinham de fazer a caricatura dos inimigos, preferiam se fixar no tamanho de seus respectivos narizes, sobre os quais criaram uma tipologia.
O nosso presidente prefere se referir ao tamanho do crânio dos nordestinos. Já deixou claro que se sente oprimido pelo “politicamente correto”. Em Parnaíba, voltou à carga: “Não tenho cabeça grande, mas sou cabra da peste”.
Ninguém, no Senado, tem o direito de duvidar das suas pretensões. Convém acreditar no que diz. Quem não está com ele é cocô e tem de ser excretado. Do país!
Os que não se subordinam a seu projeto pertencem à “turma vermelha”. Até o general da reserva Luiz Rocha Paiva, um linha-dura, pode virar um “melancia” caso não lhe faça mesuras.
E, claro!, é preciso que a Casa decida com as pernas e a coluna eretas se a trajetória e a militância de Eduardo Bolsonaro são compatíveis com a de um embaixador, que tem por tarefa representar o conjunto de brasileiros, não uma facção, uma seita ou uma família que se pretende uma dinastia.
Nem é necessário número tão grande para que o Senado preserve, no que lhe cabe, a sanidade da democracia: o país precisa de 41 brasileiros com vergonha na cara. Só a Grande Paraíba conta com 27 votos de pessoas que Bolsonaro julga ter um crânio diferente do seu.
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