Uma grata surpresa
Editorial da Folha de SP
Jair Bolsonaro (PSL) retornou ao Brasil na semana passada após o maior giro externo desde que assumiu. Como seria previsível, polêmicas institucionais sérias se alternaram com episódios anedóticos que explicitam o provincianismo algo calculado do brasileiro.
O que é uma pena, não só pelo valor negativo intrínseco a essas distrações, mas também porque a viagem a cinco países registrou um balanço de pragmatismo e correção diplomática inauditos até aqui na gestão bolsonarista.
Tome-se por exemplo a escala de Bolsonaro na China. Apenas essa construção, unindo o presidente direitista e a ditadura comunista por ele tanto espicaçada, já causaria estranhamento. Mas foi uma visita bastante profissional.
Não eram esperados anúncios grandiosos, até porque a tradição chinesa desse tipo de contato interpessoal é a do estabelecimento de confiança. Qual avaliação Xi Jinping fez de Bolsonaro é incógnita, mas foi surpreendente ver o ideológico brasileiro se comportando de acordo com o objetivo da visita.
Houve até um excesso, o anúncio da abolição da exigência de vistos para chineses, mas nada altamente reprovável. Por questionável que o regime seja, nenhum país do mundo hoje pode prescindir de laços com o gigante asiático, muito menos o Brasil —de quem Pequim é o maior parceiro comercial.
Já a etapa árabe da viagem teve o tom de um “roadshow”, evento de venda de projetos do país a investidores externos. O setor de defesa, por exemplo, abriu interlocução com grandes compradores de armas que podem vir a adquirir aviões da Embraer, blindados ou lançadores de foguetes.
A região tem dinheiro e conflitos demais para ser ignorada —a Arábia Saudita tem o terceiro maior orçamento militar do mundo.
Também foi no reino controlado por Mohammed bin Salman que houve o único escorregão, de resto esperado, da nova orientação da política externa brasileira.
Os sauditas são aliados dos norte-americanos adorados por Bolsonaro e disputam a primazia regional no Oriente Médio com o Irã, país que já teve relações próximas com o Brasil nos anos do PT no poder.
Ao chamar MbS, como o príncipe herdeiro acusado pelo esquartejamento de um jornalista é conhecido, de “irmão”, o presidente colocou o Brasil num dos lados de um conflito que não lhe diz respeito.
De positivo, o brasileiro obteve a promessa da criação de um fundo de investimento em infraestrutura de US$ 10 bilhões a partir dos profundos cofres petrolíferos sauditas.
É desse tipo de iniciativa, e não de hienas imaginárias ou ataques histéricos à imprensa, que deveria ser composto o cardápio de próximas viagens presidenciais.
Editorial da Folha de SP
Jair Bolsonaro (PSL) retornou ao Brasil na semana passada após o maior giro externo desde que assumiu. Como seria previsível, polêmicas institucionais sérias se alternaram com episódios anedóticos que explicitam o provincianismo algo calculado do brasileiro.
O que é uma pena, não só pelo valor negativo intrínseco a essas distrações, mas também porque a viagem a cinco países registrou um balanço de pragmatismo e correção diplomática inauditos até aqui na gestão bolsonarista.
Tome-se por exemplo a escala de Bolsonaro na China. Apenas essa construção, unindo o presidente direitista e a ditadura comunista por ele tanto espicaçada, já causaria estranhamento. Mas foi uma visita bastante profissional.
Não eram esperados anúncios grandiosos, até porque a tradição chinesa desse tipo de contato interpessoal é a do estabelecimento de confiança. Qual avaliação Xi Jinping fez de Bolsonaro é incógnita, mas foi surpreendente ver o ideológico brasileiro se comportando de acordo com o objetivo da visita.
Houve até um excesso, o anúncio da abolição da exigência de vistos para chineses, mas nada altamente reprovável. Por questionável que o regime seja, nenhum país do mundo hoje pode prescindir de laços com o gigante asiático, muito menos o Brasil —de quem Pequim é o maior parceiro comercial.
Já a etapa árabe da viagem teve o tom de um “roadshow”, evento de venda de projetos do país a investidores externos. O setor de defesa, por exemplo, abriu interlocução com grandes compradores de armas que podem vir a adquirir aviões da Embraer, blindados ou lançadores de foguetes.
A região tem dinheiro e conflitos demais para ser ignorada —a Arábia Saudita tem o terceiro maior orçamento militar do mundo.
Também foi no reino controlado por Mohammed bin Salman que houve o único escorregão, de resto esperado, da nova orientação da política externa brasileira.
Os sauditas são aliados dos norte-americanos adorados por Bolsonaro e disputam a primazia regional no Oriente Médio com o Irã, país que já teve relações próximas com o Brasil nos anos do PT no poder.
Ao chamar MbS, como o príncipe herdeiro acusado pelo esquartejamento de um jornalista é conhecido, de “irmão”, o presidente colocou o Brasil num dos lados de um conflito que não lhe diz respeito.
De positivo, o brasileiro obteve a promessa da criação de um fundo de investimento em infraestrutura de US$ 10 bilhões a partir dos profundos cofres petrolíferos sauditas.
É desse tipo de iniciativa, e não de hienas imaginárias ou ataques histéricos à imprensa, que deveria ser composto o cardápio de próximas viagens presidenciais.
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