Shorts curtos, minissaias, decotes e quem preferir pode ir até mesmo de calcinha e sutiã. A ideia é mostrar que as mulheres são livres para se vestir como quiserem em uma manifestação bem diferente: a Marcha das Vadias, que pretende reunir cerca de duas mil pessoas pelas ruas de Belém, hoje, a partir das 9h, com saída da Escadinha em direção à Praça da República. A caminhada já ocorreu em várias cidades do mundo, e teve início após um policial afirmar, durante uma palestra em uma universidade em Toronto, que as mulheres deveriam parar de usar roupas de vadias, "slut", em inglês, para evitar estupros.
A declaração do policial inspirou um movimento que tomou conta de cidades como Los Angeles, Chicago, Estocolmo, Amsterdã e Edimburgo, chegando ao Brasil, em São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Fortaleza, Brasília, Salvador, entre outras, e agora em Belém. "É importante que a capital paraense participe desse evento, porque ele é também um protesto contra a violência. Estamos comemorando os cincos anos da Lei Maria da Penha pedindo que o Estado intervenha nessa questão, porque as estatísticas provam que, hoje, o Pará é o terceiro estado no ranking de queixas de violência contra a mulher. São mais de 237 queixas a cada 50 mil mulheres paraenses. Somando um total de mais de quinze mil queixas em menos de seis meses", denuncia Rafaela Rodrigues, à frente da Comissão Geral da Organização da Marcha em Belém.
Rafaela faz parte da Marcha Mundial das Mulheres - movimento nascido em 2000, com uma grande mobilização de mulheres do mundo todo contra a pobreza e a violência e que reúne representantes da zona urbana e rural, em aliança com outros movimentos sociais. Ela reclama que muito pouco vem sendo feito para se combater a violência contra a mulher no Estado. "O Centro Maria do Pará, referência no atendimento às mulheres, está praticamente desativado, o que representa um descaso no combate à violência doméstica", reclama.
Por outro lado, as mulheres estão se mostrando mais conscientes de seus direitos, denunciando a violência sofrida. Somente no primeiro semestre deste ano, segundo dados da Delegacia da Mulher (Deam), 123 homens foram presos em flagrante, enquadrados na Lei Maria da Penha. "Marchamos porque infelizmente a violência contra as mulheres é um fenômeno mundial e atinge a todas, em todas as idades, raças e classes sociais, que sofreram ou sofrerão algum tipo de violência ao longo da vida, seja simbólica, psicológica, física ou sexual, por isso é preciso denunciar", afirma.
Mobilização é feita pelos canais sociais
A estudante Aline Silva, 19 anos, mora no Jurunas, já agendou presença na marcha pelas redes sociais e diz que prepara sua faixa. "A ideia da marcha é excelente, na verdade é um protesto necessário, porque ainda nos dias de hoje é comum ver a mulher ser classificada nas categorias santa, p...ou vadia. O julgamento quase sempre vem da maneira como ela anda, senta, ri ou fala. Já passou da hora da gente protestar contra. Quer dizer que o homem pode chamar a mulher de gostosa, mas se ela fizer isso é logo taxada de vadia. Essa questão é muito séria e ainda oprime as mulheres todos os dias. Pretendo levar para marcha um cartaz sobre isso", diz.
Para a doutora em ciência política Luzia Miranda Álvares, integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas Eneida de Moraes sobre Mulheres e Relações de Gênero da Universidade Federal do Pará (Gepem), criado em 1993, o fato de Belém receber um movimento com a Marcha das Vadias, aponta para mudanças significativas na sociedade, no que se refere ao seu olhar sobre as mulheres.
"Para uma sociedade ainda não habituada sequer às reverências, quanto mais a irreverências como é o caso dessa marcha, isso significa mudanças, significa que a sociedade está se acostumando a olhar as mulheres como elas sempre foram. Não como vadias, mas como pessoas trabalhadoras", acredita.
Direitos estão agregados ao ato. Mulheres querem liberdade.
A marcha também objetiva reafirmar a autodeterminação das mulheres sobre seus corpos e combater uma sociedade que educa as mulheres para não serem estupradas, mas não ensina os homens a não estuprar. "A marcha é necessária porque somos chamadas de vadias todos os dias por usarmos roupas curtas, por transarmos antes do casamento e por lutarmos pelos nossos direitos. Já fomos chamadas de vadias por sermos divorciadas, por simplesmente dizer "não" a um homem, e ainda hoje somos chamadas de vadias por sofrermos estupro. Já fomos e somos diariamente chamadas de vadias apenas porque somos mulheres trabalahdoras", diz.
Na capital paraense, a edição brasileira da "Slut Walk", ganhou toques peculiares em relação a outras mobilizações. "Essa é uma marcha bem diferente, tem um caráter bem diferenciado, onde a mobilização foi feita basicamente através das redes sociais, através do facebook, orkut, entre outros e vai contar com a participação de vários movimentos sociais como a Marcha Mundial das Mulheres, do Coletivo Juntos, do Fórum de Mulheres Paraenses, Associação de Mulheres Brasileiras, (ABM), entre outras, por isso, nossa expectativa é contar com a participação de uma média de duas mil pessoas", afirma Rafaela.
Assim como nas outras versões nacionais, a comissão organizadora garante que está sendo esperada uma participação significativa de homens. "É uma marcha pelas mulheres, onde os homens são muito bem vindos. Não aqueles que vão para ver mulheres de calcinha e sutiã, mas aqueles que vão pela causa, porque todo homem tem alguma mulheres na sua vida, seja mãe, irmã, amiga, esposa, namorada, filha que pode sofrer ou já ter sofrido algum tipo de violência", ressalta. A preparação para a Marcha em Belém vem ocorrendo ao longo dos meses e se intensificou nos últimos dias com oficinas de preparação de material de visual, como batuques, faixas, cartazes para o grande dia da caminhada, que pretende reunir mais de 2 mil mulheres. (No Amazônia)
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