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terça-feira, 25 de agosto de 2015

Dilma diz que errou ao ter demorado para perceber gravidade da crise econômica

A presidente Dilma Rousseff admitiu ontem (24) que “talvez” ela e a equipe econômica tenham cometido o erro de demorar a perceber o tamanho da crise. Dilma admitiu que “talvez” fosse o caso de ter adotado medidas corretivas ainda no ano passado, inclusive antes das eleições. Ela relatou que o governo levou muitos sustos, pois nunca previu uma queda tão brutal da arrecadação. Para a presidente, no cenário econômico internacional “o futuro é imprevisível”.

— Errei em ter demorado tanto para perceber que a situação era mais grave do que imaginávamos. Talvez, tivéssemos que ter começado a fazer uma inflexão antes. Não dava para saber ainda em agosto. Não tinha indício de uma coisa dessa envergadura. Talvez setembro, outubro, novembro — disse Dilma em entrevista ao GLOBO e aos jornais “Folha de S.Paulo” e “O Estado de S. Paulo”.

Mesmo assim, a presidente defendeu as políticas adotadas ano passado, no período eleitoral. Lembrou que o governo sustentou os investimentos e a taxa de juros de 2,5% ao ano; manteve a desoneração da folha de pagamento no valor de R$ 25 bilhões; e concedeu subsídios para todos os empréstimos de longo prazo realizados no Brasil (a juros mais baixos).
“PODERIA TER FEITO UMA ESCADINHA”
Dilma acrescentou que, em alguns casos, o governo não voltou atrás, e citou a desoneração da cesta básica. Explicou que adotou uma política para preservar o emprego e a renda, mas que essa política poderia ter sido reduzida gradativamente ao longo do tempo, adotando o que chamou de “escadinha”. Nesse caso, também se justificou:

— O que é possível considerar é que poderia ter começado (a fazer) uma escadinha. Agora, eu nunca imaginaria, ninguém imaginaria que o preço do petróleo cairia de 105 dólares (o barril) em abril, para 102 dólares em agosto, para 43 dólares hoje. A crise começa em agosto, mas só vai ficar grave, grave mesmo, mesmo entre novembro e dezembro (de 2014). É quando todos os estados da Federação percebem que a arrecadação caiu.

Ainda sobre a economia internacional, Dilma disse que “o futuro é imprevisível”. As dificuldades, segundo ela, não ficarão restritas aos exportadores de commodities para a China, pois também afetam os países que exportam máquinas e equipamentos para aquele país. A política de industrialização da China foi acelerada, e todos os países estão perdendo arrecadação.

Nos países que compõem os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), predominava a avaliação de que a crise seria superável, segundo a presidente. Mas, depois do acordo entre Estados Unidos e Irã, que colocará de 2 milhões a 3 milhões de barris de petróleo no mercado internacional, o primeiro-ministro russo Vladimir Putin previu que a renda com o petróleo vai afundar. — Ninguém podia imaginar — lamentou a presidente.

"LAMENTO PROFUNDAMENTE"
Em relação à Operação Lava-Jato, Dilma declarou que não esperava que petistas e pessoas próximas ao partido estivessem envolvidas no escândalo de corrução na Petrobras. Ela afirmou que foi pega de surpresa com o escândalo, e que lamenta o que aconteceu. O GLOBO perguntou se Dilma imaginava anteriormente que militantes ou pessoas ligadas ao PT estivessem envolvidas no escândalo da Petrobras: — Não! — reagiu a presidente.

Questionada se fora completamente surpreendida, confirmou: — Fui! E lamento profundamente! Posso falar uma coisa. Sou a favor de uma coisa que o Márcio Thomaz Bastos (ex-ministro da Justiça, morto ano passado) dizia. Não esperem que sejam as pessoas a fonte da virtude. Tem que ser as instituições. As instituições é que têm de ter mecanismo de controle. É muito difícil. Integra a corrupção o fato de ela ser escondida, clandestina e obscura.

Dilma não quis falar do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Esquivou-se dizendo que não tem opinião sobre qualquer pessoa. Para a presidente, quanto mais rápidas e efetivas forem as investigações, melhor para o país.

— Prefiro não falar sobre pessoas. Eu estou budista. Hoje sou Dilminha paz e amor — afirmou ela.

Sobre o escândalo na Petrobras, garantiu que ninguém pode interromper o processo em curso no Judiciário e nos órgãos de investigação (Polícia Federal e Ministério Público). Essa postura, diz ela, deve ser mantida mesmo que as investigações afetem a cadeia da indústria de óleo e gás e da construção civil.

— Ninguém pode chegar à Presidência e olhar para processos de corrupção como uma coisa pessoal. Só pode olhar e ver que o país deu um passo e foi para frente. Agora, sou a favor, em qualquer circunstância, do direito de defesa. É isso que torna a democracia forte.

Ao abordar as implicações políticas da crise, Dilma fez uma ironia quando os jornalistas lembraram que o ex-presidente Fernando Henrique sugeriu que ela renuncie ao mandato. — Sugerir é fácil! Não vou discutir.

A presidente procurou minimizar conflitos com o vice-presidente Michel Temer e o ex-presidente Lula. Afirmou que quem tentar afastá-la de Lula não conseguirá. Disse que foi um desserviço ao país a bomba no Instituto Lula. Fez questão de afirmar também que suas relações com Temer são de lealdade, e que foi um sucesso o trabalho do vice na articulação política, pois foram aprovadas as medidas de ajuste fiscal.

— Temer tem sido de imensa lealdade comigo. Nós tivemos uma primeira fase da articulação política coordenada pelo Temer. Qual é o resultado dessa fase? Um sucesso. Conseguimos aprovar as medidas do reequilíbrio fiscal. E estabelecemos uma relação com o Congresso. A gente perde e a gente ganha no Congresso. Cada vez que a gente perde é uma crise? Não é.

REDUÇÃO DE MINISTÉRIOS
Dilma informou que vai acabar com dez ministérios e que vai reduzir mil cargos de livre provimento ou funções gratificadas. Explicou que o objetivo principal é racionalizar a máquina, mas que também haverá corte de gastos. Pois, se isso não ocorrer, essas medidas, segundo ela, seriam “demagógicas”. Além de ministérios, serão extintas secretarias.

— Tem ministério com número de secretarias que foram sendo ampliadas ao longo dos anos. Então, agora, vamos passar todos os ministérios a limpo — disse a presidente.

Ela se negou a dizer quais as pastas serão fechadas. Explicou que o estudo ainda está sendo concluído. Essa cautela decorre, segundo ela, do fato de que será necessário fazer uma composição política com os partidos. Pois mesmo os que são a favor da redução do número de ministérios podem ter críticas sobre determinadas mudanças.

— Todo mundo é a favor. Todas as torcidas são a favor. Uma reforma dessas não se faz dentro do gabinete, sozinha — explicou Dilma.

Essa redução das pastas, segundo ela, passará também por consultas à sociedade. O governo pretende ouvir os segmentos empresariais afetados pelas mudanças. Uma das metas é racionalizar a máquina e acabar com as sobreposições de funções. — Minha meta não pode ser irracional — disse a presidente.

O objetivo do governo continua sendo retomar o crescimento, em dois ou três anos, antes das novas eleições presidenciais, em 2018. Segundo Dilma, um dos dados favoráveis nesse sentido é o que ela chamou de “embicamento” da inflação, além das políticas de investimento em logística e energia elétrica.

ESTABILIDADE DAS INSTITUIÇÕES
A estabilidade das instituições financeiras do país foi apontada pela presidente como um dos elementos positivos. Mas ela adiantou que as reformas vão continuar. Mudarão o PIS/Cofins e o ICMS, e o governo também quer reduzir gastos obrigatórios. A Previdência Social responde por 55% desses gastos fixos, fruto de ter aumentado a expectativa de vida em 4 anos e meio, nos últimos 13 anos.

Sobre a crise na China, Dilma explicou que a Bolsa chinesa sofreu uma queda grande, e isso se refletiu na derrubada de todas as Bolsas, inclusive de Japão, Taiwan, Coreia do Sul e Austrália.

— Estamos diante de retração do mercado internacional da qual não se sabe a dimensão, não se sabe. Vamos ter de saber lidar com a desaceleração internacional.

Segundo Dilma, o governo tem sido prudente e tem tomado as medidas necessárias para o país enfrentar essa situação. E isso significa aprofundar o equilíbrio das contas públicas. Esse esforço, disse ela, vai ter que ser feito sistematicamente, considerando a situação do mercado internacional.

— Não estou levantando (o tema da) China para falar que amanhã tem uma catástrofe. Não estou dizendo isso — disse a presidente. — Estou dizendo que tem uma situação de desaceleração internacional, e vamos ter que saber lidar com ela. Não atinge só a nós. Até eu voltar da reunião dos Brics, achava que essa situação era superável. Só não contava com essa queda sistemática. Estava achando que era superada por tudo o que eu sabia, por tudo o que eu escutei. Ia ter dificuldades, mas você não ia ter uma situação muito difícil. A partir de hoje, eu não sei. Ninguém sabe. Nós temos o interesse de voltar a crescer. Não estou fazendo o reequilíbrio das contas públicas em si.

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