Editorial - Folha de SP
Salvo na hipótese improvável de uma recaída de bom senso e espírito público entre deputados e senadores, o Congresso Nacional entrará em recesso nesta quarta-feira (23). Os trabalhos serão retomados somente em 2 de fevereiro. A incerteza quanto ao encaminhamento da crise econômica e política em que o país vem mergulhado, assim, se prolongará por longas e desnecessárias seis semanas. Os parlamentares agem como se não estivesse em pauta nenhum "caso de urgência ou interesse público relevante", premissas previstas na Constituição para convocar de forma extraordinária o Congresso.
Se a escolha de uma nova comissão especial da Câmara para começar a analisar o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) não satisfaz, para deputados e senadores, as condições de urgência e relevância, fica difícil imaginar o que, a seu juízo, as satisfaria.
No caso das siglas de oposição, pode-se concluir sem risco de errar que procrastina movida pelo mais rasteiro cálculo político.
Tendo embarcado de início numa aliança de conveniência com o desatinado presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), as bancadas de partidos como PSDB e DEM parecem já se dar conta de que seria mais prudente desvincular o impeachment de sua figura.
Mais ainda, avalia-se nas fileiras oposicionistas que a aprovação do afastamento de Dilma seria mais factível bem depois do Carnaval, que começa na semana de retorno do recesso parlamentar.
Passadas as festividades, acredita-se, os protestos contra o governo federal ganhariam novo ímpeto, originando a pressão das ruas sem a qual muitos consideram ser inviável aprovar o impedimento.
Após os resultados discretos da semana passada, movimentos anti-Dilma depositam esperanças no evento marcado para 13 de março.
Com outros três meses de paralisia, fermentaria ainda mais o ingrediente decisivo da crise econômica, com o agravamento de efeitos que já inquietam o país: desemprego e inflação em alta, atrasos no pagamento de funcionários públicos, retração de serviços sociais etc.
Antes disso, um processo contra Dilma teria menos chance de prosperar, entende a oposição calculista –e, como o Datafolha mostrou, houve nos últimos meses leve melhora na imagem da presidente.
Para usar uma expressão que no passado se assestava com frequência contra o PT, o grupo capitaneado por PSDB e DEM aposta na tese do quanto pior melhor.
Não é só a oposição que se apequena, mas o Congresso inteiro. Pôr-se de folga quando uma das piores crises consome o país dá demonstração cabal de que ali imperam a miopia e a alienação.
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