Adolescente, vítima de estupro coletivo, deixa hospital ao lado da mãe, no Rio
Editorial - Folha de SP
No último sábado (21), no Rio de Janeiro, uma jovem de 16 anos deixou sua casa para encontrar um garoto com quem se relacionava. Foram à casa dele, em Jacarepaguá. Depois disso, a adolescente só se recorda de ter acordado, no dia seguinte, em outro local. Nua e violentada, estava circundada por cerca de 30 homens armados. Ampliando os níveis de covardia e abjeção, o estupro foi revelado por um vídeo postado na internet, no qual a jovem aparece inconsciente, exposta e sangrando. Os homens ao redor se vangloriam do crime e debocham da vítima.
A selvageria suscitou campanhas nas redes sociais e repercutiu em publicações de diversos países —e, para tristeza dos brasileiros, não se tratava de caso único.
Um dia antes, com semelhante barbaridade, cinco homens —quatro deles menores— violentaram uma adolescente de 17 anos em Bom Jesus, no Piauí.
Episódios como esses, infelizmente, constituem intolerável rotina no Brasil. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foram registrados em 2014 (último dado disponível) quase 48 mil estupros, 1 a cada 11 minutos.
Pior, esse dado estarrecedor representa apenas uma parcela das ocorrências desse crime. Estima-se que o real número de vítimas da violência sexual no país esteja entre 150 mil e 500 mil pessoas por ano.
A subnotificação, uma regra no mundo inteiro, explica-se sobretudo por uma visão machista difusa que, em muitos casos, não só relativiza ou mesmo tolera o estupro como também transforma a mulher em culpada pelo ataque que sofreu.
Pesquisa do Ipea divulgada em 2014 mostrou que 58,5% dos entrevistados —de ambos os gêneros— concordavam com esta abominável afirmação: "Se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros".
Se ainda restarem dúvidas quanto à necessidade de o país adotar ações urgentes em relação a isso, acrescente-se outra informação ultrajante: nada menos que 90% das mulheres das grandes cidades temem ser vítimas de agressão sexual, segundo levantamento do Datafolha encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Não venham as autoridades, porém, com propostas de endurecimento penal, como se essa fosse a solução. A lei já trata o estupro como crime hediondo, agravando a pena conforme a idade da vítima. O problema não está na prescrição legal, mas na impunidade.
É preciso garantir às mulheres agredidas canais seguros para a denúncia de um crime que lhes impõe medo e vergonha. É preciso que os estupradores sejam identificados e punidos. É preciso oferecer às vítimas acompanhamento psicológico especializado.
Mas é preciso, acima de tudo, que a sociedade derrube o véu de silêncio conivente que, a não ser nas situações mais aberrantes, encobre essa tragédia humilhante.
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