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domingo, 2 de setembro de 2018

A MORTE DO FIU-FIU


Por Ruy Castro, jornalista - Folha de SP
Pesquisa da empresa YouGov ouvindo mil brasileiros revelou que ainda não estamos de todo alheios a um tema delicado: o flerte. Você costuma flertar? —perguntou a pesquisa. E como, quando e com quem? Bem, 81% dos entrevistados responderam que sim, que gostam de flertar. E 88% acham que a iniciativa pode partir do homem ou da mulher —depende do como. Já o fiu-fiu, o tradicional assobio masculino significando admiração e más intenções, foi reprovado por 32% das mulheres.

O número é enganador. Se apenas 32% das mulheres reprovam o fiu-fiu, não quer dizer que os demais 68% delas o aprovem. Se duvida, tente assobiar para uma na rua. O fiu-fiu é cafajeste, entre outras, pelo fato de ser público —todos nas proximidades o escutam e olham para a assobiada em questão. Sem falar naqueles fiu-fius que, graças à técnica do assobiador, parecem vir em itálico, câmara lenta e dolby, subindo de volume à medida que a melodia se aproxima do clímax. Mas quantos são capazes disto? Para produzir um fiu-fiu, mesmo reles, é preciso saber assobiar.

Lauren Bacall, no clássico “Uma Aventura na Martinica” (1944), de Howard Hawks, diz a Humphrey Bogart: “Se quiser me chamar, assobie. Você sabe assobiar, não? Basta fazer um bico com os lábios e... soprar...”. Havia uma insinuação marota nessa fala de Bacall, marcada pelas reticências. Pois todas as vezes em que assisti a esse filme e tentei seguir a receita, o máximo que consegui foi que a pessoa ao meu lado, ao me ver fazendo bico e resfolegando, perguntasse se eu estava me sentindo mal.

Numa de suas grandes canções, Stephen Sondheim se pergunta: “Anyone can whistle/ Why can’t I?” —“Todo mundo sabe assobiar/ Por que não eu?”. É o que eu também sempre me perguntei.

Até por falta de assobiadores, o fiu-fiu já estava em perigo. E agora, como ficou proibido assobiar para fins imorais, ele está condenado.

Foto: Humphrey Bogart prepara-se para aprender a assobiar com Lauren Bacall no filme 'Uma Aventura na Martinica”.

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