Presepada suprema
Editorial da Folha de SP
Do integrante de órgãos do Estado que têm pretensões perpétuas, como o Supremo Tribunal Federal, espera-se capacidade de tirar lições dos erros do passado a fim de evitar repeti-los. Desse processo, afinal, depende o amadurecimento institucional de toda a nação.
O ministro Marco Aurélio Mello, ao mandar soltar todos os condenados no Brasil em regime de cumprimento provisório de pena, manifestou clamoroso déficit de aprendizado. Reincidiu num conjunto de desacertos que tem favorecido o desgaste da corte.
A justeza de uma decisão individual, sob a forma precária da liminar, deveria ser sempre avaliada em contraste com o impacto imediato que irá causar. Para afastar do cargo o presidente de um Poder, como resolveu fazer Marco Aurélio com Renan Calheiros em dezembro de 2016, um rabiscar solitário de caneta nunca é o meio recomendável.
Tampouco a vontade provisória de 1/11 do plenário do STF deveria ser suficiente para libertar dezenas de milhares de pessoas —entre elas, Luiz Inácio Lula da Silva (PT)— que cumprem pena de prisão após condenação em segunda instância, mas antes do trânsito em julgado de seus processos.
Para essas causas de vastas consequências, recorrer à autoridade coletiva e mais estável da maioria dos ministros tarda a se tornar uma norma não escrita no Supremo.
Mas Marco Aurélio foi mais longe.
Como a decisão foi tomada depois da última sessão colegiada do tribunal antes do recesso do Judiciário, não havia como o STF reunir-se com celeridade para decidir sobre caso tão impactante.
O lance de esperteza é típico do Congresso, onde pode ser considerado arma legítima das minorias. Na mais alta casa da Justiça, reveste-se de irresponsabilidade pueril.
Além disso, e para piorar o quadro, o ministro Marco Aurélio se insurgiu contra decisões reiteradas da maioria da corte a favor do cumprimento da pena logo após a condenação em segundo grau.
Também atropelou, sem que houvesse urgência ou outra razão plausível, a pretensão do presidente do Supremo, Dias Toffoli, de realizar um novo julgamento de mérito dessa questão no início de abril.
A presepada terá consequências. Ainda que os efeitos da liminar tenham sido oportunamente suspensos por Toffoli após recurso da Procuradoria-Geral, mais uma pedra de descrédito foi atirada na imagem do Supremo Tribunal Federal.
O momento é ruim para a corte abrir mais flancos a críticas, e a incapacidade de alguns ministros de enxergar esse fato óbvio preocupa.
Mais que nunca, o Brasil precisa de uma cúpula do Judiciário coesa e forte para a defesa do patrimônio dos direitos fundamentais, que será posto à prova, se promessas eleitorais forem levadas à frente, pelo governo que se inicia em janeiro.
Editorial da Folha de SP
Do integrante de órgãos do Estado que têm pretensões perpétuas, como o Supremo Tribunal Federal, espera-se capacidade de tirar lições dos erros do passado a fim de evitar repeti-los. Desse processo, afinal, depende o amadurecimento institucional de toda a nação.
O ministro Marco Aurélio Mello, ao mandar soltar todos os condenados no Brasil em regime de cumprimento provisório de pena, manifestou clamoroso déficit de aprendizado. Reincidiu num conjunto de desacertos que tem favorecido o desgaste da corte.
A justeza de uma decisão individual, sob a forma precária da liminar, deveria ser sempre avaliada em contraste com o impacto imediato que irá causar. Para afastar do cargo o presidente de um Poder, como resolveu fazer Marco Aurélio com Renan Calheiros em dezembro de 2016, um rabiscar solitário de caneta nunca é o meio recomendável.
Tampouco a vontade provisória de 1/11 do plenário do STF deveria ser suficiente para libertar dezenas de milhares de pessoas —entre elas, Luiz Inácio Lula da Silva (PT)— que cumprem pena de prisão após condenação em segunda instância, mas antes do trânsito em julgado de seus processos.
Para essas causas de vastas consequências, recorrer à autoridade coletiva e mais estável da maioria dos ministros tarda a se tornar uma norma não escrita no Supremo.
Mas Marco Aurélio foi mais longe.
Como a decisão foi tomada depois da última sessão colegiada do tribunal antes do recesso do Judiciário, não havia como o STF reunir-se com celeridade para decidir sobre caso tão impactante.
O lance de esperteza é típico do Congresso, onde pode ser considerado arma legítima das minorias. Na mais alta casa da Justiça, reveste-se de irresponsabilidade pueril.
Além disso, e para piorar o quadro, o ministro Marco Aurélio se insurgiu contra decisões reiteradas da maioria da corte a favor do cumprimento da pena logo após a condenação em segundo grau.
Também atropelou, sem que houvesse urgência ou outra razão plausível, a pretensão do presidente do Supremo, Dias Toffoli, de realizar um novo julgamento de mérito dessa questão no início de abril.
A presepada terá consequências. Ainda que os efeitos da liminar tenham sido oportunamente suspensos por Toffoli após recurso da Procuradoria-Geral, mais uma pedra de descrédito foi atirada na imagem do Supremo Tribunal Federal.
O momento é ruim para a corte abrir mais flancos a críticas, e a incapacidade de alguns ministros de enxergar esse fato óbvio preocupa.
Mais que nunca, o Brasil precisa de uma cúpula do Judiciário coesa e forte para a defesa do patrimônio dos direitos fundamentais, que será posto à prova, se promessas eleitorais forem levadas à frente, pelo governo que se inicia em janeiro.
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