Editorial - Folha de SP
Há um tanto de imprecisão —ou, talvez, de estratégia— nas críticas do juiz federal Sergio Moro às "autoridades políticas brasileiras", que a seu ver dedicam pouca ênfase ao combate à corrupção. "Fica a impressão de que esta é uma tarefa única e exclusiva de policiais, procuradores e juízes", lamentou o magistrado de Curitiba, em entrevista a um consórcio internacional de jornalistas publicada pela Folha no domingo (30).
Como Moro decerto não ignora, acusações de desmandos, reais, presumidos ou infundados, e campanhas pela moralidade estão entre as armas mais antigas e eficazes da disputa política no país.
Um marco histórico, que data dos anos 1950, é a ofensiva da UDN sobre o derradeiro governo de Getúlio Vargas; nos anos 1980 e 1990, o PT apoderou-se da estratégia, a ponto de ser apelidado de "UDN de macacão" pelo ora aliado, ora adversário Leonel Brizola (PDT); com os petistas no poder, a oposição à direita retomou a bandeira.
Em tempos democráticos, tais pressões, mesmo quando meramente oportunistas e interesseiras, podem produzir resultados virtuosos —um presidente, Fernando Collor, foi deposto; comissões parlamentares de inquérito apuraram escândalos como os dos anões do Orçamento e do mensalão.
Para além dos feitos episódicos, o apelo da luta contra a corrupção proporcionou avanços institucionais dos mais relevantes.
Entre eles, um Ministério Público tido como exemplo mundial de independência e amplitude de atribuições; mais recentemente, a lei que multiplicou os acordos de delação premiada, uma das respostas políticas à onda de manifestações populares de 2013.
Sem ambos, dificilmente estaria em andamento a Operação Lava Jato que consagrou Sergio Moro.
Esta criou um cenário inédito em que governo e oposição são alvos simultâneos de inquéritos e denúncias —e que, agora sim, dá algum fundamento às preocupações externadas pelo juiz.
Parece exagerado, a esta altura, o temor quanto a um acordo legislativo que embarace investigações ou proporcione anistia às autoridades sob suspeita. Os condutores da Lava Jato, que souberam mobilizar a opinião pública contra retrocessos do gênero, deparam-se agora com desafios outros.
Decorridos mais de três anos desde o início da operação, os policiais, procuradores e juízes citados por Moro enfrentam nesta etapa a dificuldade prática de encontrar um desfecho à altura de toda a expectativa criada na sociedade.
Em meio ao oceano de delações, nas quais mais de uma centena de políticos são mencionados, constata-se que a tarefa de buscar provas suficientes para definir julgamentos é mais complexa.
Assim o demonstram as divergências internas em torno dos procedimentos de apuração, cada vez mais frequentes no noticiário.
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