Divulgada pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, não causa surpresa a informação de que o Brasil tinha 726.712 homens e mulheres encarcerados em junho de 2016, levando o País a ter a terceira maior população carcerária do mundo, ultrapassando a Rússia. Já em 2005, quando o órgão realizou o primeiro Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), se estimava ser de crescimento a tendência da população carcerária, até 2020.
Segundo o estudo, que foi feito com a colaboração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, entre 2005 e 2016 o número de presos dobrou. No período de dezembro de 2014 a junho de 2016, a população carcerária aumentou em mais de 104 mil pessoas e o índice de presos por 100 mil habitantes pulou de 306,22 para 352,6. Dos países com maior população carcerária do mundo, como os Estados Unidos, a China e a Rússia, o Brasil é o único em que esse índice registra crescimento contínuo desde 1995.
Além disso, como o poder público não construiu novas unidades penais no mesmo ritmo do aumento do número de presos, o déficit do sistema prisional, que tem cerca de 1,3 mil estabelecimentos de diferentes portes, pulou de 250.318 para 358.663 vagas, entre dezembro de 2014 e junho de 2016. É por isso que 78% das unidades penais têm mais presos do que o número de vagas e 89% da população carcerária encontra-se em prisões superlotadas, submetida a condições degradantes e sempre na iminência de motins, segundo o levantamento.
“Os números revelam que temos dois presos para cada vaga no sistema prisional. A taxa média de ocupação nacional é de 197,4%. A maior, registrada no Amazonas, é de 484%”, afirma o diretor-geral do Depen, Jefferson de Almeida. Em novembro do ano passado, o Ministério da Justiça determinou que a superlotação não poderia ser superior a 127,5% do número de vagas. Mas nenhum Estado cumpriu a determinação. O cenário só não é mais trágico porque, com a introdução das audiências de custódia e a crescente aplicação de penas alternativas, se evitou que pelo menos 140 mil pessoas ingressassem no sistema no período analisado, diz Almeida.
Do total da população carcerária, 95% são homens, 64% são negros e 55% estão na faixa etária de 18 a 29 anos. Em matéria de escolaridade, 4% são analfabetos e 51% têm o ensino fundamental incompleto. Dos crimes que os levaram à prisão, os mais recorrentes são relacionados ao tráfico de drogas (28%), roubos (25%), furtos (12%) e homicídios (11%).
O que torna o cenário do sistema prisional brasileiro ainda mais perverso é a constatação, pelo Infopen, de que a porcentagem de presos provisórios – que aguardam julgamento – passou de 37,5% em dezembro de 2014 para 40% em junho do ano passado. Como esses presos podem receber ou não sentenças condenatórias, para muitos criminólogos esse aumento seria reflexo do anacronismo das leis processuais penais e de políticas criminais equivocadas, que permitem que presos sem julgamento convivam com bandidos perigosos já condenados, convertendo, assim, prisões em escolas de criminalidade.
Contudo, esse é apenas um dos lados do problema. O outro lado é a negação, evidenciada pelo levantamento do Infopen, da ideia de que o Brasil é o país da impunidade. O aumento da população prisional e do número de presos provisórios é consequência direta do combate à criminalidade. Se a população carcerária aumentou, é porque se prendeu mais e condenou-se mais. Assim, a questão não é de impunidade, como tem sido alardeado, mas de justiça, pois não faz sentido manter encarcerado quem – seja pela natureza do crime de que é acusado, seja por sua situação legal – ainda não foi julgado. Se é indiscutível que o Estado tem a obrigação de oferecer condições dignas de custódia, o que exige mais investimentos em prisões, também é indiscutível que os dados do Infopen refletem as ações das autoridades de segurança pública contra a impunidade.