Precisávamos de cortes, vieram mais gastos. Queríamos menos Estado, veio
mais imposto. A reunião do Conselhão presidida ontem pela presidente
Dilma Rousseff (foto), com a presença de empresários, banqueiros e
lideranças da sociedade civil, parecia um daqueles filmes de terror em
que o pior vai acontecendo, e vai acontecendo, e vai acontecendo. E vai
piorando, piorando, piorando – aí piora ainda mais.
A presidente Dilma Rousseff retomou o figurino do primeiro mandato ao lançar mão de mais um pacote de medidas de estímulo à economia. Coube ao ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, anunciar a expectativa do governo de injeção de R$ 83 bilhões de crédito via bancos públicos. A estimativa, porém, depende de uma série de fatores, como autorização do Congresso e apetite de famílias e empresas em tomar empréstimos, mesmo com endividamento alto e falta de confiança no rumo da economia.
Em entrevista após a reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), o Conselhão, Barbosa disse que há demanda por crédito no País, mas que é preciso usar melhor os recursos já disponíveis para atender ao público. “Temos o desafio de normalizar o crédito no País para que possamos estabilizar e equilibrar a economia mais rapidamente”, defendeu.
Há poucas garantias, no entanto, de que os R$ 83 bilhões anunciados nesta quinta-feira, 28, cheguem efetivamente ao mercado. Desse total, por exemplo, R$ 22 bilhões se referem a recursos do FI-FGTS, um fundo de investimento que usa recursos do Fundo de Garantia para aplicar em infraestrutura. Essa verba já existe, mas, segundo uma fonte ligada ao Fundo, “o grande desafio é encontrar bons projetos para analisar e, caso aprovados pelo comitê de investimentos, alocar esses recursos”.
Outros R$ 17 bilhões são uma estimativa de quanto se poderia crescer o crédito consignado com a possibilidade de o trabalhador utilizar 10% do saldo do FGTS, mais a multa de 40% em caso de demissão sem justa causa, como garantia para o empréstimo. Esse item, porém, ainda terá de passar pelo Congresso Nacional, onde o governo vem enfrentando dificuldades para aprovar seus projetos. Também terá de passar pelo crivo do conselho curador do FGTS, onde já enfrenta resistências de alguns conselheiros, por ser uma “desvirtuação” do objetivo do Fundo de Garantia.
No mercado, as medidas são vistas com restrições. Analistas econômicos já vêm dizendo, desde que começaram a circular as informações de que o governo daria um incentivo aos financiamentos, que o problema da economia não é de crédito, mas de demanda. “Tentar liberar crédito em uma economia com crise generalizada de confiança de nada adiantará”, diz Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.
Entre as medidas anunciadas, o governo também pretende usar o FGTS para aumentar o fôlego para o crédito habitacional, ao oferecer R$ 10 bilhões como fonte de recursos para esses financiamentos. O fundo será mais uma vez utilizado como fonte de recursos para os financiamentos imobiliários, tendo em vista a fuga de mais de R$ 50 bilhões em 2015 do dinheiro da caderneta de poupança.
Para o setor agrícola, o Banco do Brasil vai liberar outros R$ 10 bilhões, sem aumentar o custo do Tesouro Nacional na compensação dos subsídios, por meio de uma engenharia que envolve a liberação de parte do compulsório que o banco é obrigado a deixar no BC. Como compensação, o banco transfere ao Tesouro o lucro com a aplicação desses recursos, algo em torno de R$ 800 milhões por ano.
Pelo BNDES, será ressuscitada a linha de capital de giro para pequenas empresas (R$ 5 bilhões), criada uma opção de crédito para máquinas e equipamentos (R$ 15 bilhões) e remodelada, com condições mais favoráveis, a operação para empresas exportadoras (R$ 4 bilhões). Segundo o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, o banco também anunciará, em breve, “aperfeiçoamentos” que permitirão ampliar a oferta sem a necessidade de aumentar os subsídios.
Para o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), as medidas anunciadas significam “o começo da retomada”. “As medidas sinalizam o esforço do governo para a retomada do crescimento. Essa sinalização dos anúncios são medidas iniciais, mas de forte impacto. Melhoram o ambiente de negócios e dão mais segurança jurídica aos investidores e não temos risco de hiperinflação.”
Para a oposição, porém, o anúncio não passa de marketing. “O governo está usando o recurso do Fundo de Garantia do trabalhador para salvar banco em dificuldade. Isso não é proposta para o trabalhador, é uma bolsa banqueiro travestida de crédito, facilitação. É o famoso engana besta. O governo está dando uma corda para o trabalhador se enforcar”, disse o líder do DEM, Mendonça Filha (PE).